sábado, 6 de maio de 2017

“Ouviu a boa notícia? Eu e Dilma vamos nos casar!”

“Ouviu a boa notícia? Eu e Dilma vamos nos casar!”



“Ouviu a boa notícia? Eu e Dilma vamos nos casar!”

O professor americano James Green fala sobre sua relação com a ex-presidente do país

POR Flora Thomson-Deveaux



FOTO: REPRODUÇÃO_FACEBOOK
Desde a última quarta-feira,
dia 3 de maio, o e-mail, o inbox do Facebook e a caixa de mensagens do
celular de James Green, professor de história latino-americana da Brown
University, estão abarrotados. Em suas postagens nas redes sociais
também passaram a transbordar comentários do tipo: “Aeeee Dilminha!”
“Cuide bem dela…” “Mais amor, menos golpe.” “Que lindo! Ela merece”.
“James, so now you’re Dilma’s new affair?”


Por telefone, ele parecia bem-humorado quando perguntei sobre o
assunto. “Não ouviu a boa notícia? Eu e Dilma vamos nos casar!”,
disse-me em tom de troça. E emendou: “Sabe que a gente realmente se deu
muito bem? Ela é tão inteligente, a gente teve conversas maravilhosas.
Ela conhece melhor os impressionistas franceses do que eu, e olha que eu
conheço bem”, disse.


Naquele dia, uma reportagem no portal RD1 dera o tom da
balbúrdia: “Saiba detalhes sobre o novo affair de Dilma Rousseff”. A
matéria tinha uma galeria de fotos da dupla – em frente ao Lincoln
Center em Nova Iorque, juntos no sebo The Strand, abraçados num
restaurante. O texto, citando “duas fontes […] que preferem não ser
identificadas”, dizia que o professor estava “encantado” pela
ex-presidente e que os dois ficaram “inseparáveis” durante a turnê dela
por várias faculdades norte-americanas. “Mas é claro que estávamos
inseparáveis, eu estava ajudando a organizar as palestras, passei vários
dias como o intérprete dela”, disse James – conhecido como Jim pelos
amigos norte-americanos e Jimmy pelos brasileiros. A única resposta que
ele deu para os veículos e curiosos querendo saber do romance:
“Bobagem.”


Os dois haviam se conhecido no dia 7 de junho do ano passado. Foi num
evento em que um grupo de historiadores foi até o Palácio da Alvorada,
residência oficial, para manifestar sua solidariedade com a presidente,
afastada da função desde a votação do dia 12 de maio. Green, autor do
livro Apesar de Vocês, sobre a resistência à ditadura brasileira que partiu dos Estados Unidos, e de Além do Carnaval,
uma história da homossexualidade masculina no Brasil, foi o último a
falar, sentado ao lado esquerdo de Dilma. “Foi uma mesa lotada de
acadêmicos e ativistas incríveis. Estava bem ansioso, como sempre quando
falo em português. Tem que acertar o gênero, se é ‘o’ ou ‘a’, se tem
que usar o subjuntivo… E eu falei da solidariedade internacional, e de
como, enquanto ela estava sendo submetida à tortura no Brasil, pessoas
nos Estados Unidos estavam se mobilizando em solidariedade. Eu estava
tão tenso que nem olhava para ela, mas as pessoas comentaram comigo
depois que ela estava prestando muita atenção.”


Depois das palestras, Green comentou com a ex-presidente que estava
escrevendo um livro sobre Herbert Daniel, companheiro de luta com quem
ela morou na clandestinidade no Rio de Janeiro em 1969. O livro, Brazilian Gay Revolutionary: The Life and Times of Herbert Daniel,
sairá em breve pela Duke University Press. Dilma ficou encantada ao
saber do tema do livro e topou ser entrevistada sobre o amigo e o
período da clandestinidade. Duas semanas mais tarde, James voltou ao
Alvorada, desta vez para um encontro particular. Dilma parabenizou-o
pelo manuscrito, disse ter passado três noites seguidas lendo. O que era
para ser uma entrevista de 45 minutos acabou sendo uma conversa de duas
horas e meia.


“Já que eu estou pesquisando esse livro há oito anos, conheço até
detalhes que Dilma nem lembrava mais”, relembrou Green. “Ela falava:
‘Você conhece melhor minha vida em 1969 do que eu!’” Por meio de
depoimentos de presos políticos e relatórios policiais, o professor
havia reconstruído uma sequência de eventos e encontros sigilosos do
grupo revolucionário do qual Dilma e Herbert Daniel participaram. De
forma tangencial, a pesquisa dele abriu uma porta para o passado da
ex-presidente, para um ano em que ela vivia as suas convicções da forma
mais intensa possível. “Ela me contou lá em Brasília que 1969 foi um dos
melhores anos da vida dela.”  Green ficou incrédulo. No ano seguinte,
ela seria presa e torturada no Departamento de Ordem Política e Social, o
DOPS. “Mas estávamos vivendo o que acreditávamos”, Dilma explicou.


O que ajudou a aproximar os dois foi o fato de o próprio Green ter
militado contra a ditadura dentro do Brasil no final dos anos 70 e ter
ajudado a organizar uma campanha internacional reunindo acadêmicos
contrários ao processo de impeachment. “Acho que ganhei um amigo novo”,
Green lembra dela comentar no final da conversa.


O reencontro dos dois se deu no mês passado. Dilma deu palestras em
nove universidades na Costa Leste norte-americana, entre elas a Brown,
onde James dá aula. Depois do evento na Brown, em Providence, Rhode
Island, ela discursou na City University of New York. No dia de folga da
ex-presidente em Nova Iorque, o estudioso a levou para passear
no Central Park (“já que sei que ela gosta de exercício físico”), ao
Metropolitan Museum of Art, e Ópera, onde assistiram a uma produção de Eugene Onegin (“Ela
adora ópera e eu também”). Os dois se viram novamente quando a
ex-presidente deu uma palestra em Harvard, no final da viagem. Green fez
as vezes de intérprete quando Dilma se encontrou com Jane Sanders,
mulher de Bernie Sanders, e com o ator Danny Glover. “E foi só isso. Foi
uma temporada muito agradável.”


Em conversas com amigos e em textos do Facebook, o professor
americano frisa o quanto Dilma não se parece em nada com a imagem que
pintam dela, de ser uma mulher severa e inarticulada. “Ela é brilhante”,
disse enfaticamente. Relatou que Dilma quis comprar um livro sobre Lord
Palmerston, primeiro ministro da Inglaterra durante os anos 50 e 60,
para entender melhor a política dele em relação à Guerra Civil
norte-americana. Foram para The Strand – daí a foto dos dois folheando
livros – e fuçaram nas prateleiras até achar um tomo dedicado ao tema.
“Daí ela falou: ‘Preciso de mais contexto’, e fomos atrás de mais três
ou quatro livros sobre a história da Grã-Bretanha no século XIX para que
ela pudesse entender melhor a conjuntura política.” Green também
rejeita a imagem da ex-presidente como durona, descrevendo-a como
divertida e engraçada. Foi com o intuito de desfazer essas percepções
negativas que ele escreveu uma postagem no dia 23 de abril sobre a
visita de Dilma e o tempo que passaram juntos:


[…] eu sempre tive dúvidas e críticas em relação aos governos de
Lula e Dilma. Porém, o que mais me impressionou durante esta semana
intensa de eventos, reuniões e interações foi a crença firme de Dilma na
democracia. As pessoas que viveram o choque elétrico do regime militar,
a censura da imprensa, os decretos arbitrários e os silêncios impostos
sobre a nação compreendem que sem democracia não há justiça e sem
justiça real e igualdade socioeconômica não há democracia.



A pessoa que eu tive a honra de conhecer um pouquinho nesta última
semana é profundamente honesta e uma pessoa íntegra. Estou muito grato
pela oportunidade de compartilhar este tempo com ela. […]”



Ao terminar de relatar o tempo que passaram juntos, o tom de Green
mudou. “O curioso sobre esse boato [do namoro] é que reflete toda a
misoginia que ronda a Dilma. Tem a percepção de que uma mulher não pode
ser livre e independente, que ela tem que ter sempre algum homem para
apoiá-la. Daí quando ela aparece com qualquer pessoa, surge essa
especulação imediata sobre um relacionamento romântico, se ela vai
casar.”


James disse não saber quem poderia estar por trás das informações passadas à RD1.
“Não tenho ideia. Ah, vai, é ridículo.” Quanto à foto em que os dois
aparecem abraçados no restaurante: “Eu tinha passado o dia inteiro
fazendo crowd control de todas as pessoas que queriam tirar foto
com ela. À noite eu me dei conta de que não tinha nenhuma foto com ela,
aí pedi para tirarem.” E na foto em que ele aparece do lado dela numa
das palestras, contemplando-a com evidente admiração: “Claro que admiro
ela! Ela foi presidente do Brasil e lutou contra a ditadura. Admiro
todos os que lutaram.”


Antes de desligar, perguntei de outra pessoa que talvez se
interessasse com a notícia dessa nova amizade: Moshe Sluhovsky, o
companheiro de Green, com quem tem um relacionamento há 24 anos. “Ele
está super ciumento”, brincou, “e a Dilma disse que ele tem toda a razão
para estar.”

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