domingo, 16 de abril de 2017

Sonegação fiscal e evasão de divisas:

Indiciado por sonegação fiscal e evasão de divisas: quem é Ronaldo Cezar Coelho, operador de Serra. Por Joaquim de Carvalho




Indiciado por sonegação fiscal e evasão de divisas: quem é Ronaldo Cezar Coelho, operador de Serra. Por Joaquim de Carvalho


O homem apontado na delação premiada da Odebrecht como operador de
caixa 2 eleitoral do chanceler José Serra foi indiciado em 2004 pela
Polícia Federal pelo crime de sonegação fiscal e evasão de divisas.


Segundo manifestação da Procuradoria Geral da República, encaminhada
em 2004 ao Supremo Tribunal Federal, a PF descobriu que, entre 1999 e
2002, período em que Serra era ministro da Saúde no governo de Fernando
Henrique Cardoso, Ronaldo Cézar Coelho enviou para o exterior, via conta
CC5, “a vultosa quantia” de R$ 197,9 milhões — o equivalente, hoje, a
R$ 500 milhões.


O Ministério Público Federal chegou a Ronaldo Cezar Coelho depois de
realizar “diligências junto à Receita Federal, à Controladoria-Geral da
União e a autoridades americanas”. É o que informa o breve relatório da
então ministra do STF Ellen Gracie, publicado no Diário da Justiça no
dia 23 de novembro de 2004, em resposta a um pedido da Procuradoria
Geral da República para abrir inquérito contra Ronaldo Cezar Coelho, que
era deputado e tinha foro privilegiado.


Na ocasião, Ellen Gracie decidiu que a competência para abrir
inquérito contra o deputado federal era da própria Procuradoria Geral da
República, e para isso bastava determinar à autoridade policial, o que
foi feito, com o deputado federal na condição de indiciado. Ronaldo
Cezar Coelho terminou o mandato em 2007, não se candidatou à reeleição e
deixou de ter foro privilegiado.


No Diário da Justiça, não há mais registro do inquérito. O
indiciamento de Ronaldo Cezar Coelho, jamais noticiado pela imprensa, é
revelador de forma como ele movimentava quantias milionárias.


A Conta CC5 (Carta Circular número 5) foi criada em 1969 pelo Banco
Central para permitir que estrangeiros em trânsito no Brasil pudessem
abrir e movimentar conta corrente. O objetivo era facilitar a vida de
estudantes universitários, pesquisadores, professores e empresários
estrangeiros que permanecessem no País por um período maior que o dos
turistas e menor que o dos que pretendessem ter residência fixa.


Como movimentam dinheiro supostamente de origem estrangeira, os
titulares das contas CC5 não pagam imposto no País e podem levar embora o
saldo, sem nenhuma taxação. Com o tempo, as contas CC5 passaram a
servir para escoamento de dinheiro sujo de toda natureza, com
milionários fazendo transferências através de laranjas estrangeiros ou
empresas de paraíso fiscal.


A primeira vez que esse tipo de conta apareceu vinculado a um
escândalo foi na época da CPI que derrubou Fernando Collor. Seu
tesoureiro, PC Farias, usava as contas CC5 para remeter dinheiro ao
exterior.


Alguns anos depois, as contas CC5 voltaram a ser notícia, quando se
descobriu uma lavanderia no Banestado, numa investigação que desaguou na
Vara do juiz Sérgio Moro, em Curitiba, com delações do mesmo Alberto
Yousseff.


Não se conhece nesta fase de Sérgio Moro nenhuma condenação de
figurões, embora no escândalo do Banestado tenham surgido nomes de
políticos e empresários famosos, alguns vinculados ao processo de
privatização do governo de Fernando Henrique Cardoso.


Ronaldo Cezar Coelho foi flagrado fora da alça de mira de Moro, em
outra investigação, mas também não teve até agora nenhuma pena por
remeter ao exterior cerca de meio bilhão de reais por meio da CC5.


Segundo o inquérito da Polícia Federal essa movimentação não foi
declarada em seu Imposto de Renda, embora Ronaldo Cezar Coelho fosse um
empresário milionário, um dos donos do Banco Multiplic.


Em 1986, ele era presidente do Multiplic, quando se candidatou a
deputado constituinte pelo PMDB e se afastou, temporariamente, das
funções executivas do banco. Era sócio do Lloyd’s, banco da Inglaterra
que teve forte atuação no Brasil, durante o governo dos militares, e de
Antônio José de Almeida Carneiro, conhecido no mercado como Bode,
apontado pela Revista Forbes como uma das maiores fortunas do mundo.


Foi por sugestão de Bode que o Multiplic fez constar em ata “voto de
reconhecimento e louvor pela valiosa, inestimável e efetiva colaboração
dada pelo sr. Ronaldo Cezar Coelho ao desenvolvimento das empresas do
Grupo Multiplic, do qual é um dos fundadores, manifestando a sua certeza
de que na vida pública terá o mesmo sucesso e as mesmas alegrais
conquistadas na condução dos negócios de suas empresas”.


Eleito deputado, se aproximou de Mário Covas, Fernando Henrique
Cardoso e José Serra, conforme registram os jornais da época. Em 1988,
acompanhou seus líderes na fundação do PSDB e depois se transformou em
presidente do Partido no Rio de Janeiro. Em seu Diário da Presidência,
Fernando Henrique faz muitos elogios a Ronaldo Cézar Coelho.


indiciamento operador de serra


“Almocei com o Ronaldo Cezar Coelho (9 de setembro de 1997). Conversa
agradável, em que ele me falou sobre um projeto de ligação entre o Rio e
Niterói, por meio de um túnel passando por São Gonçalo. O Ronaldo é
cheio de imaginação, de ideias, acha que é preciso criar o Ministério de
Desenvolvimento Urbano. Ele até seria um bom ministro, me pareceu”, diz
o então presidente da República.


Entrevistei Ronaldo Cezar Coelho algumas vezes por telefone e estive
com ele uma vez, no Hotel Copacabana Palace, quando Ronaldo me vazou um
documento sobre o plano do Exército para agir no Rio de Janeiro, numa
das crises de segurança que houve por lá. Era o governo de Marcelo
Alencar, e o plano nunca chegou a ser executado.


Eu trabalhava para a revista Veja e vi em Ronaldo Cezar Coelho uma
pessoa de conversa agradável, com o objetivo claro de estreitar seus
laços com a imprensa. Ele me contou que era carioca da gema, cresceu
numa família de classe média e estudou no Colégio Pedro II. Como
estávamos no Copacabana Palace, contou que brincava perto dali na
infância e citou o Beco das Garrafas, berço da Bossa Nova.


Na política, não passou de deputado. Entre 2000 e 2002, Ronaldo Cezar
Coelho era secretário municipal da Saúde no Rio de Janeiro e José
Serra, ministro na mesma área. Obteve de Serra verba para construir oito
maternidades e três grandes hospitais. Sua gestão na saúde teve
construções de mais e remédios de menos. Ele deixou a Secretaria depois
de uma crise que quase o levou para a prisão, por descumprir ordem
judicial que o obrigava a entregar remédios para pacientes.


Em 2006, tentou se eleger senador, mas ficou em quarto lugar. Como se
vê agora nas memórias de Fernando Henrique, destacava-se mais nos
bastidores. Em 2002, quando Serra se candidatou a presidente, seu sócio,
Antônio José de Almeida Carneiro, o Bode, doou oficialmente R$ 1,1
milhão (o equivalente hoje a R$ 3,1 milhão) para a campanha. O sócio de
Ronaldo Cézar Coelho foi o maior doador pessoa física de José Serra,
segundo a contabilidade oficial da campanha.


Em 2010, na segunda tentativa de José Serra de se eleger presidente, o
próprio Ronaldo Cezar Coelho colocou dinheiro na campanha. Na verdade,
teria sido um adiantamento, ressarcido pela Odebrecht, através de um
depósito de R$ 24 milhões (em valores corrigidos pelo IGP-M, cerca de R$
35 milhões) numa conta da Suíça. Tudo caixa 2. A Odebrecht foi uma das
estrelas do governo de Serra em São Paulo, marcado por grandes obras,
como a terceira pista da Marginal Tietê e o Rodoanel.

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