sábado, 18 de fevereiro de 2017

De racismo de youtuber a ministro raivoso:

De racismo de youtuber a ministro raivoso: Temer sabe escolher porta-voz? - Cotidiano - Cotidiano



De racismo de youtuber a ministro raivoso: Temer sabe escolher porta-voz?

Leonardo Sakamoto
O youtuber Lukas Marques foi um dos principais temas da rede nesta sexta (17). Após
a Folha de S.Paulo mostrar que o seu canal ''Você Sabia'' recebeu R$ 65
mil do governo Temer para produzir um vídeo defendendo sua reforma do
ensino médio
, começaram a pipocar, na rede, tuítes antigos postados por ele de cunho racista, machista e preconceituoso.

''Nada
contra gays, mas não me diga que isso é normal.'' ''Nao sou racista… So
acho que os pretos poderiam ae fuder mais…'' ''(`-`) (._. ) (· – ·) (
._.) ( ' -') Procurando quem me roubou numa multidão de pretos''
''Nordeste todo elegeu Dilma pq pensa com a barriga e não com a cabeça''
''Como estragar sua noite: Imagine a Dilma de quatro para você. De
Nada'' ''Mulher: tem mais de 1000 amigos no face?? É PUTA'' ''Quem gosta
de pica eh viado.. mulher gosta eh de dinheiro!'' ''A pior coisa que
tem é sapatão… MACHAO'' (sic)

Diante da polêmica negativa sobre ele e seu canal no YouTube (que possui mais de 7 milhões de seguidores), Lukas reagiu:

''Sobre
meus tweets antigos, eu peço desculpas. Não é como eu penso e me
arrependo de ter postado. Nunca tive a intenção de ofender ninguém'' e
''Não vamos mais falar sobre esses dois assuntos. Agora é bola pra
frente e fazer conteúdo legal pra todo mundo que gosta do Você Sabia.''

Independente
da sinceridade ou do oportunismo do arrependimento, é interessante que o
governo Michel Temer tenha escolhido exatamente um garoto-propaganda
que repetidas vezes tenha se pronunciado publicamente com esse conteúdo
para protagonizar uma peça publicitária de educação.

Ainda mais em
um momento em que a inclusão da formação para a empatia e da discussão
sobre ódio e intolerância,como temas transversais nas escolas de ensino
fundamental e médio é mais urgente do que nunca.

Isso, contudo,
não é novidade. Vale lembrar que um dos primeiros especialistas em
pedagogia recebidos pelo ministro da Educação Mendonça Filho, ao assumir
o cargo neste governo, tenha sido Alexandre Frota, porta-bandeira do
movimento Escola Sem Partido. O mesmo que, durante uma entrevista a um
programa de TV, narrou um caso de violência sexual do qual foi
protagonista contra uma mãe-de-santo, para deleite da plateia, que ria
como se fosse uma piada.

Nesta mesma sexta, durante solenidade de entrega do Prêmio Camões, um dos mais importantes da língua portuguesa, o escritor Raduan Nassar fez um discurso contundente contra o governo Michel Temer.
Isso já era de se esperar, uma vez que o autor de Lavoura Arcaica foi
crítico ao impeachment e é contra as reformas assumidas pelo
atual ocupante do Palácio do Planalto.

O que surpreendeu é que o
ministro da Cultura Roberto Freire – um político com experiência e que
se diz progressista – tenha usado seu discurso para criticar o
agraciado, sendo vaiado pelos presentes. ''Se ele viesse dizer que não
aceitava o prêmio, a crítica que ele fez podia até ser justa'', afirmou
Freire à Folha de S.Paulo. Também disse que Nassar ''é um adversário
recebendo um prêmio de um governo que ele considera ilegítimo'', apesar
da decisão do juri ter ocorrido antes do impeachment. O Prêmio Camões
condecora com 100 mil euros – conta dividida entre os governos
brasileiro e português.

Raduan Nassar já provou, como escritor e
como cidadão, não ser adversário de seu país, mas crítico aos que o
governam. Roberto Freire esquece que governos são transitórios e o
Estado não pertence a grupos políticos. Nassar não recebeu o prêmio do
governo Temer, mas do Estado brasileiro. Que, apesar de políticos de sua
base acharem que é a mesma coisa, na verdade, não é. Ou não deveria
ser.

Na entrega do Prêmio Jabuti de 2016, o escritor Julián Fuks,
que teve seu A Resistência escolhido como o livro de ficção do ano, fez
um duro discurso contra o governo Temer diante de representantes dos
governos municipal, estadual e federal. Que, elegantemente, ouviram as
críticas e fizeram falas protocolares. Afinal, a noite era dos premiados
e não das autoridades. Mas elegância, bom senso, saber quando ouvir e
quando falar, infelizmente, não são virtudes universais.

Temer tem
todo o direito de se comunicar com a sociedade e defender seu projeto
de governo – por mais que esse projeto não tenha sido escolhido em uma
eleição democrática e por mais que o objetivo principal dele e de seu
grupo, neste momento, seja salvar a própria pele das denúncias de
corrupção.

Mas depois da escolha questionável de um youtuber que
destila ódio nas redes sociais para ser garoto-propaganda da reforma
educacional e da falta de bom senso do ministro da Cultura, pergunto:
não seria de bom tom ele se esforçar um pouco mais para não
demonstrar que ele pensa que somos estúpidos?


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