terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Espetacularização, perseguição e inconveniências

Espetacularização, perseguição e inconveniências, por Aldo Fornazieri



Espetacularização, perseguição e inconveniências, por Aldo Fornazieri

















Lula: espetacularização, perseguição e inconveniências
por Aldo Fornazieri
De tudo o que foi investigado e revelado em relação tríplex
do Guarujá e ao sítio de Atibaia não há nenhuma evidência de que Lula
tenha cometido algum crime. Nos dois casos, o que se evidencia é uma
clara espetacularização e perseguição por parte do Ministério Público,
da Polícia Federal e por setores da mídia. Não que os dois casos não
pudessem ser investigados ou que o próprio Lula não possa ser
investigado. Mas, desde o início, há poucas evidências de que haja
qualquer conduta dolosa por parte de Lula. Assim, requer-se o
comedimento e a cautela necessárias que o agente público e a boa
investigação devem ostentar.
No caso do tríplex, está claro que a família de Lula tinha
uma quota e que decidiu não consumar a compra do imóvel. Não caso do
sítio, comprovadamente, pertence a terceiros, amigos da família Lula,
que o disponibilizaram para uso do ex-presidente. Para além disso, o que
se pode discutir são atitudes politicamente inconvenientes de Lula, mas
não atos criminosos. Não é tarefa nem do Ministério Público, nem da
Polícia Federal e nem da operação Lava Jato investigar atitudes
politicamente inconvenientes de um ex-presidente da República.
A perseguição e a espetacularização das ações do Ministério
Público e da Polícia Federal andam juntas. Elas se expressam desde a
escolha do nome das operações e se confiram nos seus desdobramentos. A
operação Triplo X da semana passada teve um claro viés político visando
atingir a figura de Lula desde a escolha do nome. É questionável até
mesmo que as prisões e condutas coercitivas da operação fossem
necessárias. Todos os detidos foram soltos.
Fica cada vez mais evidente que atos desnecessários,
ilações indevidas e espetacularizações de ações e informações emanadas e
praticadas pela PF, pelo Ministério Público e pelo juiz Sérgio Moro
adquirem cada vez mais um caráter persecutório contra Lula. A
espetacularização promovida por esses agentes públicos e reforçada por
setores da mídia visa criar cenas e estados emocionais sensacionalistas
com claro objetivo de destruir a figura política e moral de Lula.
A mídia pode até ter interesses comerciais na reprodução da
espetacularização. Mas os agentes públicos têm claros objetivos
políticos, incompatíveis com as funções que exercem. Os políticos de
oposição, cujo único programa consiste na destruição do PT e do governo,
também passaram a teatralizar as denúncias emanadas na operação Lava
Jato.
Tudo ocorre como se os vazamentos seletivos fossem verdades
incontestáveis, como se os denunciados por delações premiadas fossem
criminosos indefensáveis. Todo o movimento consiste na construção de uma
condenação prévia por parte da opinião pública. A espetacularização tem
um viés totalitário: bloqueia a discussão pública como forma de  busca e
construção da verdade. Fabrica uma verdade prévia que é imposta à
opinião pública, quando não, aos próprios juízes.



Parcialidade e inconveniências
A parcialidade do Ministério Público, da Polícia Federal e
do juiz Moro são a cada dia mais indisfarçáveis. Há uma evidente
determinação de criminalizar o PT e de inculpá-lo exclusivamente pela
corrupção no Brasil. Há uma grave omissão na investigação de denúncias
de corrupção que atingem políticos do PSDB. O caso do Ministério Público
de São Paulo chega a ser escandaloso: omitiu-se vergonhosamente na
investigação do escândalo do Metrô e promove uma espetacularização
absurda, mesmo sem provas, no caso do tríplex do Guarujá.
Recentemente, Aécio Neves foi acusado por um delator de
receber um terço das propinas provenientes da corrupção de Furnas.
Nenhuma ação do Ministério Público, nenhuma ação espetacular da Política
Federal, nenhuma providência do juiz Moro, nenhuma manchete sensacional
da mídia. Mas não é apenas a Lava Jato que é parcial. A operação
Zelotes descambou para o mesmo viés perigoso: de operação para
investigar grandes sonegadores fiscais, tornou-se instrumento exclusivo
de investigação do filho de Lula e da suposta compra de MPs. Registre-se
que a grande sonegação causa um prejuízo quatro a cinco vezes maior aos
cofres públicos em relação a aquele causado pela corrupção.
Se Lula pode ser acusado de alguma coisa nessas duas
histórias é a de conduta politicamente inconveniente, o que, em si, não é
crime, mas causa danos políticos. Todo petista tem o direito de querer
ser rico, de ter uma vida confortável e luxuosa e de se relacionar com
grandes empreiteiros e grandes empresários. Mas existe uma
inconveniência política e uma contradição ética nessa pretensão e nessa
conduta.
O projeto ético do PT é, ou ao menos era, construir altos
padrões de igualdade e de inclusão social num país extremamente
desigual. A ética diz respeito aos fins do bem comum e também aos meios e
condutas. A construção dos fins éticos requer agentes políticos
virtuosos, praticantes das virtudes republicanas. As virtudes
republicanas, além da sempre necessária prudência, se expressam na
frugalidade, na simplicidade, no despojamento, na parcimônia e na busca
da igualdade e da liberdade. O luxo, a ostentação, a corrupção são
práticas antirrepublicanas.
Pepe Mujica tinha um sitio simples antes de ser presidente
do Uruguai. Não consta que tenha feito nenhuma reforma durante o
exercício da presidência ou depois de deixa-la. Eis aí um exemplo
contemporâneo de coerência entre a luta por fins éticos e uma conduta
moral pautada pelas virtudes.
Se quisermos resgatar um exemplo histórico de virtude
republicana, podemos lembrar Lúcio Quíncio Cincinato. Depois de exercer o
consulado, poder máximo na República de Roma, ele voltou à vida
pastoril simples, trabalhando a sua própria terra. Sendo Roma atacada e
ameaçada por invasão estrangeira no ano de 458 a. C., Cincinato foi
buscado em seu sítio e investido pelo poder absoluto de ditador para
salvar a República. Afastado o perigo, ele deixou o poder para retornar à
atividade de agricultor.
Tanto o historiador Tito Lívio, quanto Maquiavel,
recomendam que os líderes prudentes devem estudar e imitar a vida dos
grandes homens virtuosos. O despojamento e a frugalidade de Cincinato o
tornaram exemplo de liderança excepcional, de modéstia, de virtude
cívica republicana em prol do bem comum. Pepe Mujica, em outras
circunstâncias históricas, deve ser valorizado pelas mesmas qualidades.
Embora o projeto dos líderes petistas, de promover a igualdade e a
inclusão social tenha um valor ético inquestionável, parece que eles se
perderam na conduta pessoal.
Aldo Fornazieri – Professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo.

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