segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Um salva vidas para a hipocondria informativa

Um salva vidas para a hipocondria informativa | Observatório da Imprensa 



Um salva vidas para a hipocondria informativa

Por Roxana Tabakman em 14/12/2015 na edição 880
As informações médicas que são
divulgadas todo dia deixam ao público confuso. A proliferação de fontes
de noticias e o fato das pessoas estarem utilizando referências não
tradicionais em matéria de informação sobre saúde geram ansiedade
crescente e, na sequência, a sensação de que estamos nos afogando em
informação. Em alguns casos, pela própria natureza do assunto, as
pessoas acabam desenvolvendo uma espécie de hipocondria informativa.


São os tempos atuais e não há mais volta possível para o passado.
Neste contexto, a curadoria de conteúdos é vista como um dos possíveis
remédios para o tratamento desta prolongada situação de mal-estar
informativo que ameaça se transformar num problema crônico
contemporâneo.



O curador seria, basicamente, alguém que monitore a informação que se
divulga no mundo digital, selecione o essencial, edite e contextualize
as histórias, e finalmente as deixe disponíveis para o usuário.
Idealmente, uma pessoa que se informe dos assuntos de saúde a traves de
bons curadores além de ficar atualizada em questões médicas ficaria
blindada contra boatos, rumores e informações irresponsáveis. As fontes
escolhidas pelos curadores teriam muito a ganhar, porque aumentariam os
seus índices de leitura e compartilhamento. A ideia é boa. O problema
que enfrentam os novos profissionais da comunicação é como fazer com
rigor e responsabilidade essa curadoria.


O conteúdo


Há muitas ferramentas para monitorar a informação digital e a
disponibilidade infinita e’ uma tentação. O curador tem a sua disposição
conteúdo de jornais, revistas, rádio, TV, blogs, programas no Youtube,
sites e redes sociais de empresas de midia, ONGs, governo, hospitais,
universidades do pais e do estrangeiro. A lista é quase infinita.


Pessoas que antes conformavam a audiência agora estão envolvidas na
produção de notícias, e o conteúdo criado por usuários, sejam
individuais, coletivos, pagos ou voluntários acrescenta um degrau maior
de complexidade. No Brasil, por exemplo, estão contabilizados ao menos
450 blogs de saúde, segundo Priscila Torres, do Blogueiros da Saúde
que ao ser consultada pelo Observatorio da Imprensa, disse que “a
grande maioria das pessoas que produzem blogs é formada por pacientes ou
familiares. Estamos fazendo um grande trabalho na formação dos
blogueiros para que produzem conteúdo com responsabilidade e
conhecimento”.


O excesso de material informativo coloca muito peso nos ombros dos
que fazem a escolha sobre o que é essencial para os objetivos a serem
atingidos. Como ter certeza que a pequena amostra selecionada representa
o que há de melhor para o público? Como não cair nos mesmo problemas
que afetam a cobertura sobre saude na grande mídia?


O dinheiro não é o único fator que suja a informação. No caso da
medicina e qualidade de vida, os médicos ou cientistas nem sempre sabem
explicar de maneira clara e atrativa. E os jornalistas, até os que
assinam na grande mídia, nem sempre passam por treinamentos que permitam
superar os complexos desafios éticos e técnicos das matérias de saúde.
Um curador vira o juiz responsável por distribuir informações geradas
por pessoas que ele não conhece, que estão mais o menos preparadas, são
mais ou menos espertas, estão mais ou menos informadas e, o mais difícil
de verificar, são mais ou menos resistentes a pressões econômicas.


Pode-se escolher divulgar apenas o trabalho dos melhores, se limitar a
traduzir do idioma original textos produzidos por repórteres céticos e
bem informados que não são simples amplificadores de ideias e de dados
alheios, e que muitas vezes trabalham nas grandes grifes midiáticas. Mas
o jornalismo de qualidade é ,no mundo todo, uma atividade em crise de
adaptação a um novo modelo de produção de informações.


Para Robert Lee Hotz, profissional de referência no jornalismo científico pelo seu trabalho no The Wall Street Journal,
está cada dia mais difícil estar bem informado. “Há mais aceso a
notícias de ciência, e menos jornalismo bom”, resume. “A tecnologia não
mudou a ciência que reportamos, mas alterou a maneira como a empacotamos
e a possibilidade de viver de jornalismo científico. O que a sua vez
diminui a qualidade.” (Mais detalhes da entrevista aqui)


Um bom curador seria como um vigia no qual depositamos a nossa
confiança. Como qualquer editor trabalha no escuro, tem que aprender a
conviver com uma voz interior que o lembre que aquelas notícias pontuais
que ele escolheu hoje, de entre muitas outras, amanhã podem acabar não
sendo verdadeiras. Na área de medicina isso e ainda mais marcante,
porque ao escolher levar uma informação ao seu público, o que predomina é
a novidade. Se o curador não quer se arriscar, terá que recomendar
apenas aqueles fatos cientificamente aceitos, evitar a tentação do
“furo”jornalístico ou logo acabará perdendo a confiança do seu público. O
trabalho rigoroso de seleção de informação científica se desenvolve, em
maior ou menor grau, no difícil terreno de comunicar incertezas.


E bom esclarecer que curar conteúdo não é, em termos simples,
aproveitar-se do trabalho dos outros. Há bastante literatura sobre o
compartilhamento ético. Para a pesquisadora Livia Vieyra
“direcionar o leitor para a íntegra da entrevista, por meio de link no
final da matéria é a forma mais correta de curadoria digital, pois o
conteúdo é reescrito ao mesmo tempo em que instiga o leitor a conferir o
restante da entrevista no veículo original.


O que é um bom conteúdo?


Dependendo dos objetivos do projeto de curadoria, ele pode informar,
ensinar, inspirar, divertir, vigiar, emocionar ou uma mistura de todos
eles. Ter toda a informação do mundo disponível jna distância de um
toque traz o risco de algumas armadilhas. Por exemplo, a tentação de
mostrar sempre que puder os dois lados da moeda. Se há uma matéria a
favor da terapia de reposição hormonal após a menopausa, e’ fácil achar
uma outra que defenda a posição contrária, por citar um exemplo.
Oferecer as distintas visões sobre um mesmo assunto, em tese , aumenta a
credibilidade do veiculo de informação. Infelizmente, em saúde, esse
falso equilíbrio é, às vezes, um presente de grego.


Está comprovado que dar espaço a opiniões contrapostas pode deixar as
pessoas mais confusas. Há também pesquisas que mostram que mesmo
deixando claro o peso das evidências, quando se oferecem pontos de vista
diferentes, estes são vistos como alternativas equivalentes. Pode
sugerir que há uma controvérsia quando não é assim, o que há é apenas
“achismo” ou boato de um lado, e ciência do outro. Na época que no Reino
Unido se perguntavam se as crianças podiam desenvolver autismo depois
de tomar uma vacina, mesmo com a maioria dos jornais dando informações
corretas, o fato de seguir a regra de ouvir os dois lados acabou dando
destaque a informações erradas o que gerou uma redução no índice de
vacinação e um aumento no caso das doenças a serem evitadas. A
responsabilidade que se assume ao querer mostrar “os dois lados” não
deve ser negligenciada.


Curadoria é, portanto, um trabalho que exige conhecimento, trabalho e
sobre tudo tempo, que se traduz em dinheiro. Mas há uma grande vantagem
que o curador tem frente ao editor clássico: a sua não é uma porta de
sentido único. `A diferença dos sistemas tradicionais de comunicação,
ele dispõe hoje de uma rede protetora, pois é retroalimentado por uma
comunidade de receptores que corrigem e sugerem. Isso gera uma curadoria
final por decantação: a rede permite a evolução permanente da
informação.


Modelos


Há muitos modelos curadoria de notícias médicas, como se destaca nos exemplos a seguir:


A página Your Health News Review (Sua
revisão de notícias de saúde, em trad. livre) que todo dia avalia as
notícias divulgadas nas principais mídias de EUA pode ser uma bom norte
para os curadores. O aceso do 24 de novembro de 2015, por exemplo, tinha
na tela de entrada o link a nove matérias. A avaliação dos curadores e
expressada de forma simples e de leitura rápida: de 1 a 5 estrelas. O
usuário pode ler as notícias, se orientando pela recomendação e conhecer
nos comentários sobre os quais a nota está baseada.


Destaco algumas recomendações: Fototerapia para a depressão (The Washington Post, 4*), duas matérias sobre os efeitos do café na saúde (CNN: 3*, STAT
5*) e uma sobre Mais uma vantagem do aleitamento materno (5*).
Apresentado como reportagem exemplar, e ponderado com cinco estrelas, um
texto do The Philadelphia Inquirer trata de uma pesquisa feita
sobre um grupo de médicos e pacientes que ganham dinheiro se o paciente
toma todo dia seu comprimido contra o colesterol. O usuário também pode
ler, seguindo o mesmo esquema de recomendação fundamentada, comunicados
de imprensa de universidades, publicações cientificas e companhias.


O projeto é extraordinário em mais de um sentido. O aceso é de graça
mas, nos bastidores do site, há uma equipe de mais de 45 pessoas
comprovadamente independentes da indústria. Os revisores conformam um
equipe multidisciplinar da qual fazem parte jornalistas, médicos,
pesquisadores e pacientes que representam ,segundo eles ,“centenas de
anos de experiência” em avaliação de evidências. Uma redação de luxo que
desde 2006 avaliou mais de 2100 matérias, sendo que cada uma passa por
três revisores.


Como é feita a seleção? As palavras que acendem a luz vermelha são
“milagre”, “cura”, “isto poderia levar a” e similares. Mas os critérios
de análise para medicamentos o terapias novas estão bem definidos: vão
desde o custo/benefício até a comparação com tratamentos alternativos.
(ver lista completa aqui
). Cada quesito pode ter três resultados, (satisfatórios, não
satisfatório ou não aplicável) e depois o valor final é visualizado em
gráficos. São muito exigentes. Em 2014, avaliaram 2015 produtos
jornalísticos, muitos deles de veículos que a grande maioria dos brasileiros tem como referência de qualidade (The New York Times, Reuters Health, a revista Time) e apenas o 15% teve nota máxima.


Não aceitam publicidade, nem apoio da indústria medica. O editor
chefe Gary Schwitzer, também diretor do Centro de Comunicação e saúde da
Escola de Saúde pública da Universidade de Minnesota, respondeu por
e-mail às minhas perguntas. Disse que se financiam com uma doação de 1,3
milhões de dólares (anos 2015-2016) de uma fundação privada. “Estimamos
acabar o ano com 375.000 visitantes únicos. Em anos anteriores nunca
tínhamos tido mais de 250.000.” Pedimos que Schwitzer avaliasse as
notícias médicas publicadas nos EUA na última década: “nós identificamos
muitos conteúdos que classificamos como picos de excelência, mas cada
vez mais nos deparamos com o pior jornalismo que já foi feito. O cenário
é de montanhas com vales, mais estes são cada vez mais largos e
profundos.”


O projeto alemão de curadoria de matérias de saúde Medien-doktor.de foi lançado em maio de 2013, inspirado no baseado no Your Health News Review
e em outros similares de Austrália e Hong Kong. Mas acrescentou uma
diferença importante: a avaliação diária é feita por jornalistas
especializados em ciência e saúde. Em consequência, incorporaram aos
critérios médicos outros quatro princípios puramente jornalísticos:
atualidade, relevância, qualidade na apresentação e precisão
jornalística.  A proposta é destacar bons exemplos para mostrar como se
faz bom jornalismo. “Os usuários se perguntam que matérias podem
acreditar e em quais não. Nós pretendemos encontrar respostas a estas
perguntas.”


Também na frequência diária, o britânico Behind the lines. Your guide to the Science that makes the News
(Detrás das linhas. Seu guia para as noticias científicas, em trad.
Livre) reporta uma única matéria divulgada pela mídia do Reino Unido (no
Daily mail, The Guardian, BBC, The Independent, etc.) com a crítica correspondente. Eu fiz um aceso no dia que examinaram uma matéria do BBC News
sobre se seria recomendável para a saúde que o celular tivesse um modo
“dormir”. Os curadores analisam as limitações da pesquisa original, e
conferem se as conclusões batem com o publicado na matéria. Oferecem
muito conteúdo extra: o link para o relatório científico original, as
ferramentas para entendê-lo, matérias dos outros veículos sobre o mesmo
assunto, mais informação sobre o tema de saúde em foco (nesse caso um
vídeo com uma reportagem sobre insônia e um teste para conhecer a
qualidade do próprio sono). O trabalho é financiado pelo Sistema
Nacional de Saúde (NHS), um órgão do governo britânico.


Recomendações básicas


Entre os trabalhos referenciais comentados, e o caos de navegar sem
bússola, há algumas possibilidades intermediárias para oferecer ao
público um meio de atravessar o mar de conteúdos digitais sobre saúde
sem se afogar.


O trabalho colaborativo e voluntario de indivíduos em rede que saibam
pesquisar, conheçam o assunto tratado ou ao menos tenham o suficiente
domínio da estatística e do método científico para opinar ou fazer
sugestões é a estratégia seguida pelo chileno Observatorio de Prensa Cientifica.
Qualquer jornalista, estudante ou cientista pode propor uma matéria com
o link ao trabalho a divulgar. Mas o jornalista deve prover a resposta a
cinco perguntas pré determinadas e o cientista a duas.


As primeiras servem para julgar a fonte, a linguagem e o benefício
para a sociedade, e o cientista tem que responder pelo conteúdo. Nascido
de ambiente acadêmico (Centro de Comunicación de la Ciencia de la
Universidad Andres Bello) o usuário vai consumir a notícia matéria
seguro de que ela conta com o aval de um cientista da área. Mas o
Observatório também quer intensificar a interação entre jornalistas e
cientistas. Trata-se de uma preocupação oposta a do projeto Stat News, uma publicação irmã do The Boston Globe, cujo objetivo é monitorar o que os cientistas dizem à imprensa. Acaba de nascer com uma seção nova The watchodogs. Onde a equipe do Stat News promete investigar o que chama de lado escuro das pesquisas científicas.


Outro exemplo interessante é Vox.com. Aproveitam o material
que está disponível grátis na internet mas acrescentam valor. O
resultado pode se conferir na seção de Ciência e Saúde. Fiz um aceso no
dia que publicaram a matéria “As Dietas mais pesquisadas no Google” (trad. Livre). Observaram o amplo material do Google
sobre os métodos de emagrecimento mais procurados e, provavelmente,
seguidos da década 2005- 2015 com um olhar inteligente. E o acompanharam
de um texto explicativo titulado (em trad. livre) “8 fatos para prevenir uma loucura


Mais simples. Há ainda uma opção mais simples, que é recomendar
leitura, audição ou visualização sem acrescentar nada ao já difícil
trabalho de fazer escolhas. Veículos digitais como o Stat fazem sugestões diárias para o seu público. Quando acessei, as recomendações eram três: uma matéria do Boston Globe (sobre o debate da segurança dos jalecos brancos nos profissionais de saúde), uma da revista britânica Nature (história sobre os animais geneticamente modificados na China) e uma programa de rádio Science Friday (sobre remédios).


No mundo real, os níveis de liberdade do curador para todos nesse quesito é bastante variável. O site M de mulher
da Editora Abril por exemplo, oferece aceso a informação de saúde que
provem fundamentalmente do conteúdo de outros veículos da mesma empresa:
Saúde e vital, Boa forma, Elle, Bebê’.


Curadoria automática


Consumir apenas o que foi selecionado de acordo com o interesse
pessoal é uma tentação para quem não tem tempo e sofre de ansiedade
informativa.  As grandes empresas digitais e os editores acreditam e
apostam neste tipo de comportamento, como faz o Facebook, com o seu aplicativo Instant Articles.


A curadoria automática, baseada em algoritmos, é diferente da
agregação automática de conteúdos por palavra-chave, pois é uma
plataforma que inclui conteúdos de publicações (da imprensa. blogs,
portais, etc) e não simplesmente justapõe trechos. Há muitos sistemas de
curadoria automatizada e quase todas elas tem suas limitações.  :


Fiz um teste cm o Feedly.com (apenas em inglês) e fui convidada a
selecionar as fontes de informação que pretendia seguir. Depois de
descartar as fontes que considerei pouco confiáveis, como a de um blog
pessoal de um homem que se definia como “pai e vegetariano”, acabei me
limitando as que já recebo diariamente em minhas redes sociais (BBC
Health, CNN Health e outras) . O dia que fiz o teste no Yahoo Saúde,
tive uma experiência ainda mais limitada: as três matérias destacadas e
as 15 não destacadas, vinham todas de uma mesma agência de notícias, a
francesa AFP.  Mesmo sendo um texto em português , não havia nenhum
conteúdo referente ao Brasil. Das 18 recomendações mostradas na tela,
apenas uma era da América Latina (denúncia de perseguições aos defensores do aborto)


Faz alguns anos, o site chileno Mata-sanos que produz conteúdo de medicina próprio, fez um teste para oferecer aos seus leitores a plataforma Scoop.it
. O assunto escolhido para a prova foi “Como as tecnologias da
informação mudaram a relação médico paciente”. Meses depois o
abandonaram porque, segundo os responsáveis pelo site chileno, “o
conteúdo era majoritariamente em inglês, e isso ficava fora de nosso
foco”. Fiz também meu teste com o algoritmo curador de Scoop.it ,
coloquei como focos de interesse saúde, medicina e qualidade de vida, e
não tive problemas com a língua, tinha material em portugués. No
instante vi na tela muitos links escolhidos, na teoria, para satisfazer o
meu interesse. Destaco duas: “Ciência é motor da produtividade agrícola
e da melhoria da qualidade de vida”, do site do Centro de Informações
em Biotecnologia, e “5 práticas sexuais consideradas sujas que fazem bem
a saúde” do Youtube.


Para efeito de comparação, me cadastrei como interessada em matérias de saúde em português também na revista Clipboard
uma das que oferece o serviço de publicações pessoais. Recebi na minha
tela muitas matérias, de poucas fontes e com conteúdo diversificado. O
universo informativo abarca desde atualidade sobre a microcefalia até
uma técnica para mudar a cor dos olhos, esta última de um site que não
passaria nenhuma das rígidas avaliações citadas no começo deste artigo.


Na minha experiência pessoal, portanto, os algoritmos curadores de
conteúdo são por enquanto dessas ideias que só funcionam bem na teoria.
Mesmo se fosse impecável, se tivesse algum tipo de filtro de qualidade
eficaz e eficiente, há uma razão importante pela qual não é boa ideia
abrir mão dos curadores humanos. O algoritmo reduz uma pessoa ao que
acha são as suas preferências e, em termos práticos, isso significa que a
sua visão do mundo vai se estreitando cada vez mais.


O curador profissional


Provavelmente, o que se verá os próximos anos será combinações mais
ou menos sucedidas de curadorias compartilhadas entre algoritmos e’
intervenções profissionais multidisciplinares. Modelos que aproveitem a
rapidez, memória infinita e visão estendida das máquinas, sem deixar de
lado o olhar humano.


Qualquer cidadã conectado já e curador de informação. De todas as
notícias de remédios ou tratamento novos, de toda as evidencias que se
difundem diariamente de que algo produz ou cura o câncer, de todas as
recomendações para emagrecer com saúde, só alguns deles são escolhidos
pelas pessoas para serem amplificados. A diferença no critério dos
curadores dará as chances das novidades serem verdadeiras, as
perspectivas realmente originais e a opinião de qualidade.


Atrair público a um produto que consiga um balanço economicamente
sustentável da excelência e o desafio. Outros processos nos quais um
curador profissional poderá mostrar a diferença com o leigo continuam,
depois da seleção, na editorialização, na hierarquização do conteúdo, na
representação de forma acessível seja por meio da narrativa, de
infográficos ou ambos. Em poucas palavras, na criação de um produto novo
que vai ser compartilhado. Finalmente, o curador é chamado a intervir
no que constitui o foco de monetização do jornalismo digital, o
engajamento.


“Curar não é gerar conteúdo novo, é muito mais do que colar
informação“, resume Anita Howart, da Universidade Brunel de Londres em “Exploring a curatorial turn in journalism
. “Envolve representar de maneiras imaginativas, reformulando o
conteúdo existente em novas configurações. Neste sentido, a curadoria
representa uma forma de criatividade crescentemente comum na era das
mídias sociais, a de misturar e reimaginar o material existente para
criar algo novo.” Para Anita, o que diferencia o curador de outros
profissionais das redações é o volume, a natureza e a verificação do
material com o que trabalha.


O mundo comunicacional se divide entre os pessimistas, que encaram a
curadoria de conteúdos como um sintoma da agonia do jornalismo, e os
otimistas que a enxergam como uma nova maneira de exercer a profissão,
fazendo circular conhecimento com práticas novas. Os otimistas acreditam
que é uma maneira de dar um novo impulso a imprensa por meio da
recirculação de conteúdos gerando novas audiências. Qualificam a
curadoria como uma forma de evitar a perda de diversidade na mídia
tradicional. Celebram uma maneira de deixar de consumir mais do mesmo,
com garantia de qualidade.


A curadoria de conteúdo é o futuro? Há quem pensa que depois da explosão dos websites e o boom
das redes que geraram um dilúvio de dados, vem a terceira onda, a dos
filtros. Gary Schwitzer, jornalista com 40 anos de experiência em saúde,
e que nove anos atrás criou o Your Health News Rewiew faz a
seguinte analogia: “Os consumidores de notícias de saúde tem sede de um
pequeno gole de informação completa, equilibrada, e precisa para
enfrentar a variedade de decisões relativas a saúde que devem enfrentar.
Mas com o fluxo de informação a alta pressão que recebem, é como tentar
beber da mangueira dos bombeiros. Os consumidores estão se afogando, e
nós tentamos atirar um salva-vidas para eles”.


***


Roxana Tabakman  é bióloga,  jornalista e autora do livro “A saúde na
mídia (Medicina para jornalistas, jornalismo para médicos)”. Ed.
Summus.


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