sábado, 14 de novembro de 2015

O antipetismo em nome de um moralismo de fancaria

O antipetismo em nome de um moralismo de fancaria — CartaCapital



O antipetismo em nome de um moralismo de fancaria

A direita se vale do moralismo da elite financeira que sonega impostos e suborna funcionários públicos





por Roberto Amaral







publicado
13/11/2015 04h59














A tarefa prioritária,
ingente e agônica da esquerda e dos liberais progressistas é esmagar o
ovo da serpente antes que a peçonha contamine por completo o corpo
social, costurando as bases de um Estado reacionário, conservador,
autoritário e, ninguém se engane, protofascista. Assim se vem
modificando o caráter da sociedade brasileira, aos poucos mas sistematicamente.


Ele se manifesta sob as mais variadas facetas, no Parlamento e na vida social.


O antipetismo
em nome de um moralismo de fancaria  – esse que a imprensa e os
partidos de oposição destilam – é apenas uma só de suas máscaras, como o
moralismo é apenas um disfarce. Pois tudo, fatos e criações, são,
tão-só o instrumento de uma tentativa, em marcha desde 2013, ou antes,
de implantação, entre nós, de uma clima de violência que lembra (pelos
efeitos psicossociais) o  fascismo italiano e o nazismo alemão em suas
infâncias, envenenando as entranhas de suas sociedades.


Não caminham, ainda, pelas ruas, os camisas pretas, os grupos
paramilitares quebrando lojas de judeus e espancando homossexuais,
prostitutas, negros e comunistas, mas celerados conspurcam velórios e atacam o Instituto Lula.
Ontem, nos anos da ascensão integralista brasileira, os camisas verdes
das hordas de Plínio Salgado desfilavam impunes até a tentativa de
assassinar o presidente Vargas em um putsch covarde que lembrava e
imitava a primeira tentativa hitlerista de tomada do poder (levante de
Munique, 1924) pelo golpe de força.


Nos idos brasileiros da repressão militar, grupos de aloprados
depredaram no Rio de Janeiro o Teatro Opinião e em São Paulo invadiram
 o Teatro Ruth Escobar durante montagem de “Roda Viva”? Nos estertores
do terrorismo praticaram atentados contra a OAB e a Câmara Municipal do
Rio de Janeiro e tentaram o felizmente frustrado massacre do Riocentro.
São sempre os mesmos, variam os países, variam as datas e os pretextos
mas a ideologia do ódio e a covardia na ação são as mesmas. 



Agora, súcias de ululantes bem nutridos, vestidos ou não com a
camisa da seleção canarinha, tentam, em todo o país, mediante o
amedrontamento físico, interditar, em um hospital da grã-finagem
paulistana, nas ruas, nos bares, nos aviões, nos aeroportos, a livre
circulação de homens de bem como, Guido Mantega, João Pedro Stédile e,
de último, o ministro Patrus Ananias.



Tudo isso está na crônica jornalística. Mesmo em seus momentos mais
acres de disputa política, a direita brasileira jamais havia ousado
tanto e jamais nossas esquerdas haviam recuado tanto, e jamais os
liberais foram tão omissos.


Os primeiros sinais foram dados na abertura dos Jogos Pan-americanos,
no Rio de Janeiro (2007), e replicados em Brasília na abertura da Copa
das Confederações em 2013. A esquerda não quis ver nem ouvir, fez-se de
morta, como se as vaias e as agressões – primeiro a Lula, depois a Dilma
– não lhes dissessem respeito e, assim, silente e inerte permaneceu sem
qualquer tentativa de compreender as jornadas de 2013 – prenúncio as
dificuldades de 2014, que assistiu atônita.

O moralismo da elite financeira
que sonega impostos e suborna funcionários públicos sempre foi a chave
para a conquista da classe média. Dele sempre se valeu a direita, no
Brasil e em todo o mundo.
Assim foi entre nós nos idos de 1954 quando a classe média,
majoritariamente, e setores liberais da sociedade, populares e mesmo o
movimento estudantil, e mesmo setores da esquerda e comunistas sob a
liderança de Pestes, abraçaram  o cantochão da direita  que a todos
mobilizou no pedido de renúncia de Getúlio Vargas, quando o alvo,
encoberto pela denúncia de  um ‘mar de lama’ que jamais existiu, era a
política nacionalista do ditador feito presidente democrata. A história
não se repete, mas há pontos de contato entre dois momentos históricos
tão distintos.


Getúlio também levara a cabo uma campanha presidencial levantando as
teses progressistas do nacionalismo e do trabalhismo, mas, para
executa-las, montara um ministério  reacionário. Era a sua forma de
compor com as elites, especialmente paulistas, que  sempre lhe foram
hostis. Era a velha ilusão da conciliação de classes, que conquistaria
Lula tantos anos passados.


Não deu certo com Getúlio como não daria certo com Lula e não está
dando certo com Dilma. Atacado pela direita, inconformada com a aliança
do trabalhismo com o nacionalismo, viu-se Vargas em 1954  sem o apoio
das massas trabalhistas. Essas só foram às ruas – e foram como turba,
sem vanguarda – depois do suicídio. E, aí, nada mais havia a ser feito.


Naquela altura como hoje, e como nos preparativos de 1964, a imprensa
brasileira, igualmente monolítica e igualmente de forma quase unânime,
servia à saturnal dos ódios que envenenava a opinião publica e deixava
aturdido o povo, mesmo os trabalhadores – então como agora desassistidos
ideologicamente por seus partidos e organizações.


Uma vez mais o governo de centro-esquerda se vê no cume de uma
campanha de descrédito presidida pela imprensa, uma vez mais a partir da
cantilena moralista. Uma vez mais o governo de centro-esquerda se vê
desprotegido no Congresso, onde dominam ora uma oposição ensandecida,
ora uma base parlamentar movida a negócios e negociatas e negocinhos a
cada votação.


Para não dizer que a história se repete, lembremos que os postos
antes ocupados por Carlos Lacerda, Afonso Arinos, Aliomar Baleeiro e
outros de igual calibre é exercido hoje por Paulinho da Força, Jair
Bolsonaro, Ronaldo Caiado e Eduardo Cunha – o que apenas diz que o
aviltamento da linguagem e dos procedimentos alcançou o mais baixo nível
da República.


Uma vez mais, agora como em 1954, as grandes massas não afluem em defesa de seu governo.


Uma vez mais a moralidade é um mero biombo dos grandes interesses em jogo.


Pois o que está em jogo não é a moralização dos costumes – e quem é
contra? – nem é só a tentativa de assalto  ao mandato legítimo da
presidente Dilma. Não é só a destruição do PT e dos demais partidos de
esquerda, inclusive daqueles que ainda hoje pensam que passarão
incólumes. Não é apenas a destruição de Lula, ainda a maior liderança
popular deste país depois de Vargas.


O que está em jogo são os interesses dos trabalhadores, da economia e
da soberania nacionais, de defesa  ainda mais difícil após eventual
derrocada do atual governo. Adiada – até quando ? – a hipótese do impeachment
clássico, a oposição põe em prática um novo projeto de golpe, contra o
qual nem a base parlamentar do governo – heterogênea e frágil –,  nem
muito menos sua articulação política parecem preparadas para enfrentar.


Trata-se da tática de impedir o governo de governar, e contra
essa artimanha nem mesmo as últimas negociações ministeriais – penosas,
rasteiras, pedestres e nada republicanas – se mostraram eficientes.  E
enquanto o governo não governa e se desgasta perante a opinião pública, a
direita governa, desfazendo, no Congresso ordinário, as grandes
conquistas da Constituição de 1988.


A direita, sob a batuta de Eduardo Cunha, faz sua parte, e dessa
desconstituição conservadora fazem parte o  fim do desarmamento, o fim
da demarcação das terras indígenas (fim dos índios?), o fim dos direitos
sexuais das mulheres, e a quase legalização do estupro,  o fim da
pós-graduação pública gratuita.


Este é o golpe.


A destruição do governo Dilma levará de roldão a política de
prioridade nas compras estatais aos produtos e bens nacionais, levando
consigo, de saída, a indústria naval brasileira. Levará de roldão os
projetos sociais, como o Minha casa, Minha vida; o Luz para Todos; como o Bolsa Família. Mudará a política de reajuste do salário-mínimo e, fundamentalmente, a política de transferência de renda.


Será a renúncia ao pré-sal (já caminha o projeto José Serra), será o
fim de uma política externa autônoma, com a aliança subserviente e
submissa aos interesses dos EUA, será o fim do Mercosul e a retomada da
Alca, nossa recolonização, será um torpedo contra os BRICS e uma ameaça
às experiências de governos independentes na América do Sul. (


Por isso, certa está  a Frente Brasil Popular por entender que os
erros da atual política econômica – agravados pela crise ética que
assolou os governos do PT –  não podem servir de argumento para a
omissão na defesa do mandato da presidente Dilma, ou, dito por outras
palavras, nem a defesa do mandato inviabiliza a crítica à política
econômica, nem a crítica à politica econômica inviabiliza a defesa do
mandato.


Ao contrário, a  defesa do mandato deve ser feita de par com o
combate à política recessiva e esse combate deve ter em vista a
reaglutinação das forças progressistas de esquerda, com objetivo claro,
deter a reação. Para isso é preciso construir uma nova correlação de
forças.

Nenhum comentário:

Postar um comentário