domingo, 17 de fevereiro de 2013

Brasil mantém doentes mentais presos ilegalmente - Jornal O Globo



Vinicius Sassine 
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SÃO LUÍS - Num buraco ao lado de uma criação de porcos, da tubulação de esgoto e do resto da comida servida na Casa de Detenção (Cadet), Cola na Cola passa as noites e cumpre sua pena. José Antônio dos Santos não admite mais ser chamado pelo nome, refuta pai e mãe, veste-se com roupas femininas e se considera mulher. Só atende pela alcunha Cola na Cola, uma expressão que ninguém sabe explicar de onde surgiu.
— Fui eu que mandei fazer essa cadeia. E não estou preso. Fico aqui pelo chamado para acabar com a corrupção — diz ele.
O Estado nunca diagnosticou seu transtorno mental. Nos últimos dois anos, ele não aderiu a qualquer tratamento psiquiátrico, não tomou uma única medicação nem esteve numa consulta médica. O buraco onde mora está na entrada do presídio, na parte de dentro, onde ficam os porcos, as galinhas e o lixo.
No pátio de uma pequena igreja improvisada numa das celas da Cadet, o maior presídio de regime fechado de São Luís, um jovem de 24 anos estende um colchão para passar as noites. Paulo Ricardo Machado tem os olhos esbugalhados, frases aceleradas, uma postura impassível. Há dois meses, foi diagnosticado com esquizofrenia paranoide e dependência ao crack. A loucura de Paulo Ricardo explodiu na Cadet depois que um preso introduziu um cabo de vassoura no ânus do jovem. Para conter os surtos, técnicos de saúde da unidade pediram a aplicação de oito sessões de eletrochoque no rapaz. Eles dizem ter sido atendidos.
Num cubículo de cela, sem nada, Francisco Carvalhal, 50 anos, tenta domar a agressividade. Ele já foi absolvido uma vez pela Justiça, em razão de a esquizofrenia paranoide ter impedido a compreensão de um ato ilícito. O juiz determinou que Francisco fosse internado no Hospital Psiquiátrico Nina Rodrigues, o único existente na rede pública em São Luís, para o cumprimento de uma medida de segurança. O hospital rejeitou o paciente. Dias depois, sem medicação e em surto, ele matou a mãe. Para escapar de um linchamento, foi levado para o Centro de Detenção Provisória (CDP) Olho D'Água, onde permanece há dois meses.
800 absolvidos ainda detidos
Cola na Cola, Paulo Ricardo e Francisco somam-se a outros presos portadores de doença mental que vivem à margem das estatísticas oficiais e da lei. Na teoria, a existência do transtorno mental e a consequente aplicação de uma medida de segurança a partir da absolvição pelo juiz impedem a permanência de loucos infratores nos presídios.
Levantamento inédito do GLOBO revela a extensão do universo de loucos nos presídios brasileiros — um grupo cuja existência parte da sociedade brasileira prefere ignorar. Pelo menos 800 pessoas absolvidas pela Justiça em razão de transtornos mentais e em cumprimento de medida de segurança estão detidas em presídios e cadeias públicas país afora.
A medida tem um prazo mínimo de um a três anos, é determinada pelo juiz responsável pelo processo — logo após a absolvição do acusado — e deve ser cumprida em hospitais de custódia, clínicas ou ambulatórios. Essas pessoas são consideradas inimputáveis ou semi-imputáveis, uma vez que a manifestação dos problemas psiquiátricos impediu a compreensão dos crimes, e deveriam estar em tratamento médico. Na prática, cumprem pena no cárcere.
A quantidade pode ser até três vezes maior: outros 1,7 mil brasileiros acusados de diferentes crimes já receberam indicação da Justiça de que podem ter transtornos mentais e aguardam, além de um laudo psiquiátrico, tratamento médico dentro de presídios, em casa ou nas ruas. Em alguns estados, como São Paulo, a espera numa fila dura mais de um ano. Em outros, o laudo nunca é elaborado.
O levantamento do GLOBO foi feito junto às secretarias de administração penitenciária, defensorias públicas e varas de execução penal nos estados, além de consultas a fontes nos Ministérios da Saúde e da Justiça. O Sistema Integrado de Informações Penitenciárias (Infopen), alimentado pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça, registra a existência de 3,9 mil pessoas em cumprimento de medida de segurança, seja em internação ou em tratamento ambulatorial. Os doentes mentais nos presídios identificados pelo jornal não entram na conta.
Os números oficiais tratam dos 26 manicômios judiciários e alas de tratamento psiquiátrico — anexadas a presídios — ainda em funcionamento em 20 unidades da federação. Cabe a esses hospitais de custódia receber os loucos infratores submetidos a medidas de segurança de internação. O Infopen ignora as pessoas que cumprem a medida em prisões e até mesmo os inscritos em dois programas em Goiás e Minas Gerais que pregam a desinternação, como preconiza a Lei Antimanicomial de 2001. Somados os três universos — manicômios, presídios e programas de desinternação —, a quantidade de loucos infratores é de 8,1 mil, mais do que o dobro do que consta no Infopen.
— A situação mais grave envolvendo medidas de segurança é a dos detidos em presídios. A responsabilidade pela integridade física do preso é do Executivo e, pelo andamento do processo, da Justiça. A Lei de Tortura prevê responsabilização por ação e omissão. Não há qualquer justificativa para as prisões — afirma o juiz Luciano Losekann, auxiliar da presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário.
Para a produção de uma série de reportagens sobre o assunto, O GLOBO esteve em sete presídios, uma ala de tratamento psiquiátrico e um manicômio judiciário em São Luís, Teresina, Goiânia e Brasília. Nas três primeiras cidades, a equipe conseguiu entrar nas unidades prisionais na companhia de juízes e de um promotor de Justiça. Em Brasília, uma autorização judicial permitiu ter acesso às prisões.
A reportagem flagrou uma realidade de uso contumaz do crack, hipermedicação e inexistência de prontuários em Brasília; a existência de uma ala específica para presos com transtornos mentais num presídio de regime fechado em Goiânia, além de pessoas em cumprimento de medida de segurança misturadas com detentos comuns; e doentes mentais nos mesmos espaços de pacientes com hanseníase e aids no manicômio em Teresina. Em São Luís, pessoas com transtornos mentais estão presas sem qualquer perspectiva de decretação da medida de segurança. Não há laudos, exames ou psiquiatra: a única que atendia no complexo prisional deixou de ir ao trabalho porque está sem pagamento desde dezembro. Um rol de irregularidades que combinam com o “sistema medieval” descrito pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, no final do ano passado.
Segurança não garante tratamento
Pelo menos 25 pessoas cumprem medida de segurança nos presídios em São Luís. Não é o caso de Cola na Cola, o detento que vive num buraco na Cadet há três anos. Condenado a 19 anos de prisão pela suposta prática de dois estupros, é a terceira vez que ele passa pelo presídio. Mesmo com um evidente quadro de loucura, nunca houve um exame de insanidade mental.
A medida de segurança não garante tratamento psiquiátrico. Francisco Carvalhal, absolvido num processo por homicídio em razão da esquizofrenia, deveria permanecer internado “pelo tempo necessário à sua recuperação”, como decidiu a Justiça em São Luís. O Hospital Nina Rodrigues deu alta a ele mesmo com a “falta de clareza” sobre a possibilidade de convívio imediato. No mesmo mês, Francisco matou a mãe. Ela relatava desde 2001 ameaças e pedia a internação do filho.
Após a reportagem do GLOBO flagrar as três situações no Maranhão, a Defensoria Pública pediu aplicação de medida de segurança a Cola na Cola e a Paulo Ricardo, e o juiz Douglas de Melo Martins decidiu reencaminhar Francisco ao Hospital Nina Rodrigues. A Secretaria da Administração Penitenciária do estado não respondeu aos questionamentos da reportagem.

A história secreta da renúncia do papa – Escrevinhador

A história secreta da renúncia do papa – Escrevinhador
Por Eduardo Febbro, na Carta Maior
Os especialistas em assuntos do Vaticano afirmam que o Papa Bento XVI decidiu renunciar em março passado, depois de regressar de sua viagem ao México e a Cuba. Naquele momento, o papa, que encarna o que o diretor da École Pratique des Hautes Études de Paris (Sorbonne), Philippe Portier, chama “uma continuidade pesada” de seu predecessor, João Paulo II, descobriu em um informe elaborado por um grupo de cardeais os abismos nada espirituais nos quais a igreja havia caído: corrupção, finanças obscuras, guerras fratricidas pelo poder, roubo massivo de documentos secretos, luta entre facções, lavagem de dinheiro. O Vaticano era um ninho de hienas enlouquecidas, um pugilato sem limites nem moral alguma onde a cúria faminta de poder fomentava delações, traições, artimanhas e operações de inteligência para manter suas prerrogativas e privilégios a frente das instituições religiosas.
Muito longe do céu e muito perto dos pecados terrestres, sob o mandato de Bento XVI o Vaticano foi um dos Estados mais obscuros do planeta. Joseph Ratzinger teve o mérito de expor o imenso buraco negro dos padres pedófilos, mas não o de modernizar a igreja ou as práticas vaticanas. Bento XVI foi, como assinala Philippe Portier, um continuador da obra de João Paulo II: “desde 1981 seguiu o reino de seu predecessor acompanhando vários textos importantes que redigiu: a condenação das teologias da libertação dos anos 1984-1986; o Evangelium vitae de 1995 a propósito da doutrina da igreja sobre os temas da vida; o Splendor veritas, um texto fundamental redigido a quatro mãos com Wojtyla”. Esses dois textos citados pelo especialista francês são um compêndio prático da visão reacionária da igreja sobre as questões políticas, sociais e científicas do mundo moderno.
O Monsenhor Georg Gänsweins, fiel secretário pessoal do papa desde 2003, tem em sua página web um lema muito paradoxal: junto ao escudo de um dragão que simboliza a lealdade o lema diz “dar testemunho da verdade”. Mas a verdade, no Vaticano, não é uma moeda corrente. Depois do escândalo provocado pelo vazamento da correspondência secreta do papa e das obscuras finanças do Vaticano, a cúria romana agiu como faria qualquer Estado. Buscou mudar sua imagem com métodos modernos. Para isso contratou o jornalista estadunidense Greg Burke, membro da Opus Dei e ex-integrante da agência Reuters, da revista Time e da cadeia Fox. Burke tinha por missão melhorar a deteriorada imagem da igreja. “Minha ideia é trazer luz”, disse Burke ao assumir o posto. Muito tarde. Não há nada de claro na cúpula da igreja católica.
A divulgação dos documentos secretos do Vaticano orquestrada pelo mordomo do papa, Paolo Gabriele, e muitas outras mãos invisíveis, foi uma operação sabiamente montada cujos detalhes seguem sendo misteriosos: operação contra o poderoso secretário de Estado, Tarcisio Bertone, conspiração para empurrar Bento XVI à renúncia e colocar em seu lugar um italiano na tentativa de frear a luta interna em curso e a avalanche de segredos, os vatileaks fizeram afundar a tarefa de limpeza confiada a Greg Burke. Um inferno de paredes pintadas com anjos não é fácil de redesenhar.

Bento XVI acabou enrolado pelas contradições que ele mesmo suscitou. Estas são tais que, uma vez tornada pública sua renúncia, os tradicionalistas da Fraternidade de São Pio X, fundada pelo Monsenhor Lefebvre, saudaram a figura do Papa. Não é para menos: uma das primeiras missões que Ratzinger empreendeu consistiu em suprimir as sanções canônicas adotadas contra os partidários fascistóides e ultrarreacionários do Mosenhor Levebvre e, por conseguinte, legitimar no seio da igreja essa corrente retrógada que, de Pinochet a Videla, apoiou quase todas as ditaduras de ultradireita do mundo.
Bento XVI não foi o sumo pontífice da luz que seus retratistas se empenham em pintar, mas sim o contrário. Philippe Portier assinala a respeito que o papa “se deixou engolir pela opacidade que se instalou sob seu reinado”. E a primeira delas não é doutrinária, mas sim financeira. O Vaticano é um tenebroso gestor de dinheiro e muitas das querelas que surgiram no último ano têm a ver com as finanças, as contas maquiadas e o dinheiro dissimulado. Esta é a herança financeira deixada por João Paulo II, que, para muitos especialistas, explica a crise atual.
Em setembro de 2009, Ratzinger nomeou o banqueiro Ettore Gotti Tedeschi para o posto de presidente do Instituto para as Obras de Religião (IOR), o banco do Vaticano. Próximo à Opus Deis, representante do Banco Santander na Itália desde 1992, Gotti Tedeschi participou da preparação da encíclica social e econômica Caritas in veritate, publicada pelo papa Bento XVI em julho passado. A encíclica exige mais justiça social e propõe regras mais transparentes para o sistema financeiro mundial. Tedeschi teve como objetivo ordenar as turvas águas das finanças do Vaticano. As contas da Santa Sé são um labirinto de corrupção e lavagem de dinheiro cujas origens mais conhecidas remontam ao final dos anos 80, quando a justiça italiana emitiu uma ordem de prisão contra o arcebispo norteamericano Paul Marcinkus, o chamado “banqueiro de Deus”, presidente do IOR e máximo responsável pelos investimentos do Vaticano na época.
João Paulo II usou o argumento da soberania territorial do Vaticano para evitar a prisão e salvá-lo da cadeia. Não é de se estranhar, pois devia muito a ele. Nos anos 70, Marcinkus havia passado dinheiro “não contabilizado” do IOR para as contas do sindicato polonês Solidariedade, algo que Karol Wojtyla não esqueceu jamais. Marcinkus terminou seus dias jogando golfe em Phoenix, em meio a um gigantesco buraco negro de perdas e investimentos mafiosos, além de vários cadáveres. No dia 18 de junho de 1982 apareceu um cadáver enforcado na ponte de Blackfriars, em Londres. O corpo era de Roberto Calvi, presidente do Banco Ambrosiano. Seu aparente suicídio expôs uma imensa trama de corrupção que incluía, além do Banco Ambrosiano, a loja maçônica Propaganda 2 (mais conhecida como P-2), dirigida por Licio Gelli e o próprio IOR de Marcinkus.
Ettore Gotti Tedeschi recebeu uma missão quase impossível e só permaneceu três anos a frente do IOR. Ele foi demitido de forma fulminante em 2012 por supostas “irregularidades” em sua gestão. Tedeschi saiu do banco poucas horas depois da detenção do mordomo do Papa, justamente no momento em que o Vaticano estava sendo investigado por suposta violação das normas contra a lavagem de dinheiro. Na verdade, a expulsão de Tedeschi constitui outro episódio da guerra entre facções no Vaticano. Quando assumiu seu posto, Tedeschi começou a elaborar um informe secreto onde registrou o que foi descobrindo: contas secretas onde se escondia dinheiro sujo de “políticos, intermediários, construtores e altos funcionários do Estado”. Até Matteo Messina Dernaro, o novo chefe da Cosa Nostra, tinha seu dinheiro depositado no IOR por meio de laranjas.
Aí começou o infortúnio de Tedeschi. Quem conhece bem o Vaticano diz que o banqueiro amigo do papa foi vítima de um complô armado por conselheiros do banco com o respaldo do secretário de Estado, Monsenhor Bertone, um inimigo pessoal de Tedeschi e responsável pela comissão de cardeais que fiscaliza o funcionamento do banco. Sua destituição veio acompanhada pela difusão de um “documento” que o vinculava ao vazamento de documentos roubados do papa.
Mais do que querelas teológicas, são o dinheiro e as contas sujas do banco do Vaticano os elementos que parecem compor a trama da inédita renúncia do papa. Um ninho de corvos pedófilos, articuladores de complôs reacionários e ladrões sedentos de poder, imunes e capazes de tudo para defender sua facção. A hierarquia católica deixou uma imagem terrível de seu processo de decomposição moral. Nada muito diferente do mundo no qual vivemos: corrupção, capitalismo suicida, proteção de privilegiados, circuitos de poder que se autoalimentam, o Vaticano não é mais do que um reflexo pontual e decadente da própria decadência do sistema.
Tradução: Katarina Peixoto
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Deus hipotético, por Luis Fernando Verissimo

Blog de Ricardo Noblat: colunista do jornal O Globo com notícias sobre política direto de Brasília - Ricardo Noblat: O Globo

Deus hipotético, por Luis Fernando Verissimo

Luiz Fernando Verissimo
Um religioso dirá que não faltam provas da existência de Deus e da sua influência em nossas vidas. Quem não tem a mesma convicção não pode deixar de se admirar com o poder do que é, afinal, apenas uma suposição.
A hipótese de que haja um Deus que criou o mundo e ouve as nossas preces tem sobrevivido a todos os desafios da razão, independentemente de provas.
Agora mesmo assistimos ao espetáculo de uma empresa multinacional às voltas com a sucessão no comando do seu vasto e rico império, e o admirável é que tudo — o império, a riqueza e o fascínio dos rituais e das intrigas da Igreja de Roma — seja baseado, há 2000 anos, em nada mais do que uma suposição.


Todas as religiões monoteístas compartilham da mesma hipótese, só divergindo em detalhes como o nome do seu deus. E todas têm causado o mesmo dano, em nome da hipótese.
Não é preciso nem falar no fundamentalismo islâmico, que aterroriza o próprio islã. Há o fundamentalismo judaico, com sua receita teocrática e intolerante para a sobrevivência de Israel.
O fundamentalismo cristão, que representa o que há de mais retrógrado e assustador no reacionarismo americano, e as religiões neopentecostais que se multiplicam no Brasil, quase todas atuando no limite entre o curandeirismo e a exploração da crendice.
A Igreja Católica pelo menos dá espetáculos mais bonitos, mas luta para escapar do obscurantismo que caracterizou sua história nestes 2000 anos, contra um conservadorismo ainda dominante. A hipótese de Deus não tem inspirado as religiões a serem muito religiosas.
Há aquela parábola do Dostoievski sobre o encontro do Grande Inquisidor com Jesus Cristo, que volta à Terra — o filho da hipótese tornado homem — para salvar a humanidade outra vez, já que da primeira vez não deu certo.
Os dois conversam na cela onde Cristo foi metido por estar perturbando a ordem pública, e o Grande Inquisidor não demora a perceber que a pregação do homem ameaçará, antes de mais nada, a própria Igreja, a religião institucionalizada e os privilégios do poder.
Não me lembro como termina a parábola. Desconfio que, se fosse hoje, deixariam o Cristo trancado na cela e jogariam a chave fora.

domingo, 10 de fevereiro de 2013

Da relação direta entre ter de limpar seu banheiro você mesmo e poder abrir sem medo um Mac Book no ônibus | [the dude's talk]

Da relação direta entre ter de limpar seu banheiro você mesmo e poder abrir sem medo um Mac Book no ônibus | [the dude's talk]

UPDATE: Muita gente tem lido este post como uma idealização da Holanda como um lugar paradisíaco. Nada mais longe da verdade. A Holanda não é nenhum paraíso e tem diversos problemas, muitos dos quais eu sinto na pele diariamente. O que pretendo fazer aqui é dizer duas coisas: a origem da violência no Brasil é a desigualdade social e 2, apesar da violência que gera, muita gente gosta dessa desigualdade e fica infeliz quando ela diminui, porque dela se beneficia e não enxerga a ligação desigualdade-violência. Por fim: esse post não é sobre a Holanda. A Holanda estar aqui é casual. Esse post é sobre o Brasil, minha pátria mãe.

A sociedade holandesa tem dois pilares muito claros: liberdade de expressão e igualdade. Claro, quando a teoria entra em prática, vários problemas acontecem, e há censura, e há desigualdade, em alguma medida, mas esses ideais servem como norte na bússola social holandesa.
Um porteiro aqui na Holanda não se acha inferior a um gerente. Um instalador de cortinas tem tanto valor quanto um professor doutor. Todos trabalham, levam suas vidas, e uma profissão é tão digna quanto outra. Fora do expediente, nada impede de sentarem-se todos no mesmo bar e tomarem suas Heinekens juntos. Ninguém olha pra baixo e ninguém olha por cima. A profissão não define o valor da pessoa – trabalho honesto e duro é trabalho honesto e duro, seja cavando fossas na rua, seja digitando numa planilha em um escritório com ar condicionado. Um precisa do outro e todos dependem de todos. Claro que profissões mais especializadas pagam mais. A questão não é essa. A questão é “você ganhar mais porque tem uma profissão especializada não te torna melhor que ninguém”.
Profissões especializadas pagam mais, mas não muito mais. Igualdade social significa menor distância social: todos se encontram no meio. Não há muito baixo, mas também não há muito alto. Um lixeiro não ganha muito menos do que um analista de sistemas. O salário mínimo é de 1300 euros/mês. Um bom salário de profissão especializada, é uns 3500, 4000 euros/mês. E ganhar mais do que alguém não torna o alguém teu subalterno: o porteiro não toma ordens de você só porque você é gerente de RH. Aliás, ordens são muito mal vistas. Chegar dando ordens abreviará seu comando. Todos ali estão em um time, do qual você faz parte tanto quanto os outros (mesmo que seu trabalho dentro do time seja de tomar decisões).
Esses conceitos são basicamente inversos aos conceitos da sociedade brasileira, fundada na profunda desigualdade. Entre brasileiros que aqui vêm para trabalhar e morar é comum – há exceções -  estranharem serem olhados no nível dos olhos por todos – chefe não te olha de cima, o garçom não te olha de baixo. Quando dão ordens ou ignoram socialmente quem tem profissão menos especializadas do que a sua, ficam confusos ao encontrar de volta hostilidade em vez de subserviência. Ficam ainda mais confusos quando o chefe não dá ordens – o que fazer, agora?
Os salários pagos para profissão especializada no Brasil conseguem tranquilamente contratar ao menos uma faxineira diarista, quando não uma empregada full time. Os salários pagos à mesma profissão aqui não são suficientes pra esse luxo, e é preciso limpar o banheiro sem ajuda – e mesmo que pague (bem mais do que pagaria no Brasil) a um ajudante, ele não ficará o dia todo a te seguir limpando cada poerinha sua, servindo cafézinho. Eles vêm, dão uma ajeitada e vão-se a cuidar de suas vidas fora do trabalho, tanto quanto você. De repente, a ficha do que realmente significa igualdade cai: todos se encontram no meio, e pra quem estava no Brasil na parte de cima, encontrar-se no meio quer dizer descer de um pedestal que julgavam direito inquestionável (seja porque “estudaram mais” ou “meu pai trabalhou duro e saiu do nada” ou qualquer outra justificativa pra desigualdade).
Porém, a igualdade social holandesa tem um outro efeito que é muito atraente pra quem vem da sociedade profundamente desigual do Brasil: a relativa segurança. É inquestionável que a sociedade holandesa é menos violenta do que a brasileira. Claro que aqui há violência – pessoas são assassinadas, há roubos. Estou fazendo uma comparação, e menos violenta não quer dizer “não violenta”.
O curioso é que aqueles brasileiros que queixam-se amargamente de limpar o próprio banheiro, elogiam incansavelmente a possibilidade de andar à noite sem medo pelas ruas, sem enxergar a relação entre as duas coisas. Violência social não é fruto de pobreza. Violência social é fruto de desigualdade social. A sociedade holandesa é relativamente pacífica não porque é rica, não porque é “primeiro mundo”, não porque os holandeses tenham alguma superioridade moral, cultural ou genética sobre os brasileiros, mas porque a sociedade deles tem pouca desigualdade. Há uma relação direta entre a classe média holandesa limpar seu próprio banheiro e poder abrir um Mac Book de 1400 euros no ônibus sem medo.
Eu, pessoalmente, acho excelente os dois efeitos. Primeiro porque acredito firmemente que a profissão de alguém não têm qualquer relação com o valor pessoal. O fato de ter “estudado mais”, ter doutorado, ou gerenciar uma equipe não te torna pessoalmente melhor que ninguém, sinto muito. Não enxergo a superioridade moral de um trabalho honesto sobre outro, não importa qual seja. Por trabalho honesto não quero dizer “dentro da lei” -  não considero honesto matar, roubar, espalhar veneno, explorar ingenuidade alheia, espalhar ódio e mentira, não me importa se seja legalizado ou não. O quanto você estudou pode te dar direito a um salário maior – mas não te torna superior a quem não tenha estudado (por opção, ou por falta dela). Quem seu pai é ou foi não quer dizer nada sobre quem você é. E nada, meu amigo, nada te dá o direito de ser cuzão. Um doutor que é arrogante e desonesto tem menos valor do que qualquer garçom que trata direito as pessoas e não trapaceia ninguém. Profissão não tem relação com valor pessoal.
Não gosto mais do que qualquer um de limpar banheiro. Ninguém gosta – nem as faxineiras no Brasil, obviamente. Também não gosto de ir ao médico fazer exames. Mas é parte da vida, e um preço que pago pela saúde. Limpar o banheiro é um preço a pagar pela saúde social. E um preço que acho bastante barato, na verdade.
PS. Ultimamente vem surgindo na sociedade holandesa um certo tipo particular de desigualdade, e esse crescimento de desigualdade tem sido acompanhado, previsivelmente, de um aumento respectivo e equivalente de violência social. A questão dos imigrantes islâmicos e seus descendentes é complexa, e ainda estou estudando sobre o assunto.

Do Ego ao Coração : A Coca-cola e o campo de distorção da realidade

Do Ego ao Coração : A Coca-cola e o campo de distorção da realidade

A Coca-cola e o campo de distorção da realidade

                                       Manifestação do dia 4 de outubro de 2012 - POA
                           Todo ser humano é o mestre da sua própria realidade. Estamos criando ela o tempo todo, mas temos a tendência de entregar o nosso poder para autoridades externas que se proclamam conhecedoras da verdade e alegam querer o melhor para nós. 

             Por trabalhar na área da educação, faz algum tempo que acompanho e observo as propagandas produzidas pela Coca-cola, que tem aproveitado a busca intrínseca do ser humano de descobrir a si próprio, de modo a associar o seu produto a esta necessidade e, assim, criar maior mercado de consumo.

            
               Associação do produto à identidade das pessoas
         
                "Não saber quem somos" é o incentivo por trás da mudança, crescimento e expansão em nosso mundo. Guardamos uma espécie de saudade de um estado de consciência em que consigamos ser nós mesmos, sem que estejamos limitados por padrões, julgamentos ou rótulos. Este estado de consciência, ao qual me refiro, guarda os potenciais adormecidos para a liberdade e a maestria sobre nós mesmos. Na educação, trabalhamos com esta busca de identidade na formação emocional de jovens e adultos e, a cada dez pessoas perguntadas sobre quem elas verdadeiramente são, reconhecemos que, em grande parte, a maioria vive em crise: ora se identificando com suas qualidades; ora com seus defeitos; ora com traços da personalidade como profissão ou papéis sociais que cumpre, etc. 

                 Ao identificar-se com papéis sociais e imagens externas a você mesmo, sua consciência é colocada sobre uma gangorra, estando sempre sujeita aos altos e baixos da sua personalidade. Por este motivo, temos uma questão que move o ser humano a ir para frente, de modo a encontrar-se e libertar-se dos condicionamentos, rótulos e julgamentos, que normalmente o tiram do seu centro de equilíbrio. 

              A Coca-cola, desse modo, criou uma associação do seu produto à identidade física do ser humano, sabendo que a sua auto-estima está apoiada sobre a externalidade de si e não ao seu âmago mais profundo. 


             Este objetivo não é levá-lo a conhecer-se e nem explorar seu real potencial, mas manipulá-lo a tal ponto que você faça da indústria do refrigerante o seu modo e sistema de pensar. Ninguém pode organizar a própria vida sem algum sistema de pensamento. E uma vez que tenhamos desenvolvido um sistema de pensamento qualquer, viveremos em função dele. Como isto acontece? Veremos adiante.


              A utilização de palavras-chaves associadas à imagem do produto da Coca-cola, constitui naquilo que conhecemos modernamente como "mapa mental". Um mapa mental é uma ferramenta poderosa no que se refere à aprendizagem, pois por meio dele conseguimos atingir as duas áreas do cérebro, emocional e racional, e fazer com que informações sejam retidas na memória de longo prazo. Porém, a forma como a Coca-cola vem utilizando esta ferramenta produz um fenômeno também conhecido na área da educação como "campo de distorção da realidade".  Vejamos a seguinte propaganda:


            Aqui temos a imagem do produto associada às palavras-chaves "Abra a felicidade". Uma imagem é o método mais poderoso de comunicar uma idéia. As imagens são um meio de exercer poder sobre as pessoas, já que possuem um impacto muito forte sobre o lado emocional do cérebro. Quando elas estão associadas a palavras-chaves e estas fazem referência às necessidades dos seres humanos, ocorre um fenômeno típico: os mapas mentais tornam as pessoas subservientes a ponto de desconectá-las das suas verdadeiras necessidades, de modo que troquem suas próprias necessidades pelo produto, sem o uso da força física ou da violência. Isto é o que chamaríamos de controle invisível da mente e é algo que viceja livre nas propagandas produzidas pela Coca-cola, fazendo com que as pessoas entreguem voluntariamente o seu próprio poder e valor. Eles iludem-nos de tal forma que não precisamos ser violentamente forçados a nada; aceitamos os valores retratados pelo mapa mental como se fossem os nossos próprios e agimos de acordo com eles. Por isso, essa indústria tem criado muitas falsas imagens a respeito de felicidade que não servem a ninguém, a não ser àqueles que as constroem. Veja esta:


          Mais uma vez temos a utilização da imagem associada a palavras-chaves que fazem referência às necessidades dos seres humanos. Perceba o destaque que é dado à palavra FELICIDADE. Agora olhe estas outras:


             É óbvio que nunca encontraremos a felicidade numa garrafa de plástico com líquido preto, mas é desse modo que atua-se sobre o "campo de distorção da realidade". As informações devem ser alojadas na memória de longo prazo do indivíduo, a fim de que seu cérebro reproduza estas categorias de percepção e não consiga distinguir a realidade da ilusão. Como o ser humano busca por felicidade a cada respiração, a propaganda propõe verdadeiros moldes sobre os quais se vestirão nossas tendências individuais, a fim de que possamos encontrar rapidamente em nossa memória os arquivos "instalados", sob medida, pela propaganda. Isto constituirá a nossa "história incorporada". É essa "história incorporada" ou imprinting culturalinscrito no cérebro, que funcionará como princípio gerador do que fazemos, como um conjunto de disposições para a ação, através do qual sejamos levados a facilmente organizar nosso mundo a partir das escolhas, opções e comportamento de consumidor.

                            
               Derrubado o "Tatu da Copa", símbolo da Coca-cola, em Porto Alegre.   
           
           É nosso papel desvelar os modos ocultos e invisíveis com que esta indústria se utiliza para manipular a vida das pessoas e assim produzir a dominação.  Quando utilizo o termo desvelar, sustento que se trata de evidenciar aquilo de que não se quer saber ou que não se quer que saiba - coisas que, de alguma forma, as pessoas sabem, mas que estão situadas num nível de profundidade onde não se vai procurá-las. Porém, não há como escondê-las por muito tempo. Abraham Lincoln sabiamente disse que pode-se enganar a todos por algum tempo; pode-se enganar alguns por todo o tempo; mas não se pode enganar a todos por todo tempo.  

                                    Manifestação no Largo Glênio Peres.
           Fato este que, no dia 4 de outubro de 2012, ocorreu uma forte manifestação popular no Largo Glênio Peres, em Porto Alegre, contra a privatização dos espaços públicos e retirada do boneco inflável "Tatu da Copa" da Coca-cola, que teve como objetivo quebrar os grilhões do mero poder e autoridade dessa indústria que cria desilusões e ilusões e fazer com que esta estrutura de poder seja vista como ela verdadeiramente é. Nosso intuito não é o de atacar a Coca-Cola, embora pareça. Ao contrário, buscamos proteger a verdade, a fim de devolver às pessoas seu poder de auto-decisão.
             O que aconteceu teve realmente um valor simbólico muito grande. Mesmo que a Brigada Militar tenha respondido com violência brutal e sem justificativa, vimos uma verdade abafada, escondida, profunda, ser-nos revelada: o imprinting cultural ou "história incorporada", que nos é dada pelas idéias convencionais da sociedade de consumo, representadas ali pela Coca-Cola, sofreu o fermento da rejeição e da inadaptação, característicos de nossa cultura profundamente adolescente, que procura, ataca e subverte, agressivamente, as regras impostas pelo "status quo". 

             E isto é uma ameaça intolerável e inaceitável para a hierarquia reinante, que anseia por controle porque tem medo. É o medo das mudanças. No entanto, a mudança é a única coisa que é inevitável.  Há um número cada vez maior de pessoas que vêm pensando diferente, fazendo novas perguntas e questionando a ordem existente.  O que faz com que convidem uma nova dinâmica e uma nova energia para entrar e acordar a sociedade que está dormindo o sono rígido e sufocado dos velhos hábitos, vendidos em garrafas de plástico com líquido preto, sob a falácia e distorção de que aquilo é a felicidade. Estas imagens irreais de felicidade não têm mais nenhuma conexão com o coração humano e esperam para ser transformadas por você, por pessoas inspiradas que ousam abrir novas perspectivas e que ajudem as outras a se conectar com seus corações e com seus verdadeiros desejos.
Veja os vídeos:
      

 Autor: Tiago Bueno Camargo

A peculiaridade brasileira | Carta Capital

A peculiaridade brasileira | Carta Capital

Mino Carta

Nos seus derradeiros momentos como senador, Fernando Henrique Cardoso andava pelos corredores do Congresso acompanhado por Norberto Bobbio. Digo, carregava um ensaio do pensador italiano, a analisar um assunto veementemente provocado pela queda do Muro de Berlim: ainda vale falar de direita e esquerda?
Solidão. Às vezes a presidenta que pretende erradicar a miséria parece isolada. 

A direita mundo afora decretava o fim das ideologias, -enquanto a esquerda mostrava-se reticente. Bobbio entrou em cena e afirmou: nada disso, a dicotomia não se apaga, seria como pretender negar o bem e o mal, a luz e a sombra, a verdade e a mentira. E a verdade, no caso, é outra.
A tese de Bobbio pode ser resumida na seguinte ideia: é automática e naturalmente de esquerda quem se preocupa com os destinos dos desvalidos do mundo e se empenha pela igualdade. Recordam? Liberdade, igualdade, fraternidade. A liberdade por si só não basta à democracia, a igualdade é fundamental. Quanto à fraternidade talvez seja admissível substituí-la pela solidariedade.
A julgar pelo desvelo de ponta de dedos com que FHC carregava o livrinho (ia escrever, sobraçava, mas a obra é de porte modesto) me entreguei à suposição de que o futuro presidente da República rendia-se de bom grado aos argumentos do autor, a confirmar crenças pregressas. No entanto, pouco tempo após, soletraria: esqueçam o que eu disse.
À sombra de FHC presidente, o PSDB tornou-se um partido de direita. Em lugar de abrandá-las, acentuou as disparidades ao aderir à religião neoliberal e sujeitar-se às vontades e interesses do Tio Sam. Sem contar a bandalheira da privataria, a compra dos votos a favor da reeleição e o “mensalão” tucano.
Ao entrevistar o presidente Lula no fim de 2005, pergunto se ele é de esquerda, responde nunca ter sido. “Você sabe disso”, diz, ao recordar os velhos tempos em que nos conhecemos, já faz 36 anos. Jogo na mesa a carta de Norberto Bobbio, observo: “Você sempre lutou a favor da igualdade”.
Deste ponto de vista, há toda uma orientação esquerdista nas políticas sociais implementadas pelo governo Lula e hoje fortalecidas por Dilma Rousseff. E é de esquerda em mais de um aspecto a política econômica do governo atual, mais ousada do que a do anterior ao se desvencilhar das injunções neoliberais.
Nada irrita e assusta mais a direita brasileira do que qualquer tentativa de demolir de vez a senzala. É o que me permito explicar ao correspondente de um jornal americano, perplexo diante dos comportamentos da mídia nativa, sempre alinhada de um lado só. Digo: ela é o instrumento da casa-grande. O estupor do colega do Hemisfério Norte não arrefece: “Mas os governos Lula e Dilma produziram bons resultados para todos, senhores incluídos…”
Defronto-me, de súbito, com a dificuldade de aclarar uma situação incompreensível aos olhos do semelhante civilizado, capaz de usar, para medi-la, o metro próprio da contemporaneidade do mundo. E aos meus condoídos botões segredo: difícil, difícil mesmo, talvez impossível, trazer à luz da atualidade este cenário tão peculiar, de um país que viveu três séculos e meio de escravidão e que, de certa forma, ainda não digeriu o seu passado.
O jornalista americano arregala os olhos: “Mas como é possível que Dilma Rousseff tenha índices de aprovação elevadíssimos e sofra ao mesmo tempo o ataque maciço da mídia?” A presidenta, respondo, pretende erradicar a miséria… Logo percebo que a peculiaridade verde-amarela envolve o próprio governo. Há momentos em que Dilma parece isolada. Solitária. Ela é obrigada à aliança com o PMDB para garantir a maioria em um Congresso inconfiável e a postura do próprio PT é, no mínimo, dúbia. Falta ao Brasil desta hora um verdadeiro partido social-democrático, esquerdista no sentido de Norberto Bobbio.

Dirceu e Genoino podem ser absolvidos ? | Conversa Afiada

Dirceu e Genoino podem ser absolvidos | Conversa Afiada
O ansioso blogueiro telefona para Justiniano, marido de Teodora e autor de manual de Direito que se encontra nos sebos de Roma.

—  Prezado Mestre, o que lhe pareceu o prefácio do Ayres Britto no livro do Ataulfo Merval (*) ?
—  O que vocês, sujos, já disseram, meu filho: uma imoralidade. E pior: ele pode ser desmentido pelo próprio Supremo.
—  Como assim, Grande Imperador ?
—  Vamos imaginar que o Celso de Mello, apesar dos esforços do Gilmar …
—  Dantas (**) …
—  Sim, Dantas. Apesar dos esforços do Dantas, quero dizer, Gilmar, o Celso de Mello resolva aposentar-se.
— E daí ?
—  Serão três  novos ministros no Supremo. O Zavascki e os substitutos do Britto e do Celso de Mello.
—  É quando o Gilmar vai ficar mais só do que pardal na chuva…
—  Exatamente, meu filho. Não sei se ele resistirá à irrelevância política.
—  É, mas deixar aquele púlpito, Imperador, e descer à planície para enfrentar os Sassânidas …
— Não interrompa o nexo do meu argumento. Você quer saber, ou não quer ? Tenho mais o que fazer nos aposentos imperiais com a querida Teodora …
— Sim, sim ! Adiante, por favor ! Teodora saberá esperar …
— Com três novos ministros tudo pode mudar.
— Mudar como, se o Dirceu e o Genoino já foram condenados irremediavelmente pelo Ataulfo Merval !
— Data venia, o Ataulfo, mas com o julgamento dos recursos e três novos  ministros tudo pode mudar: há um novo relator e uma nova composição do plenário.
— Rever a condenação ? Se o Supremo julgou tá julgado: Roma locuta causa finita. Não serei eu a lhe ensinar isso ..
— Meu filho, reduza-se à sua Processual insignificância. O julgamento do recurso é um novo julgamento. NOVO ! Entendeu ?
— Mas eles já foram julgados pela ultima instância, Imperador. O Supremo é Supremo !
— Em geral, no mundo normal, um mesmo juiz não julga a sua própria decisão. Mas, o mensalão não foi julgado no mundo normal. Não houve o duplo grau de jurisdição. O julgamento do recurso é essa segunda chance que todo acusado tem. Desde que eu escrevi aquele manualzinho …
— Quer dizer que o recurso no Supremo é como se fosse o segundo grau de que os acusados Dirceu e Genoino dispõem … “Acusados”, porque eles ainda não foram condenados definitivamente.
— Isso se o Ataulfo concordar. Você sabe. Ele tem o poder de veto e de voto.
— E muito mais, Sábio Imperador.
— Então, acompanhe meu raciocínio. Com a mudança de um voto o Genoino não vai para o semi-aberto. E com a mudança de dois votos o Dirceu não vai preso.
— Quer dizer, então, que o Big Ben de Propriá …
— Quem ?
— O Ayres Britto…
— Por que Big Ben de Propriá … que maluquice é essa ?
— É que ele é de Propriá. E lá tem um Big Ben que marcou direitinho a hora de condenar o Dirceu …
— Que hora ?
— Na hora em que os eleitores de São Paulo tinham que escolher entre o Cerra e o Haddad…
— Ah, entendei … Era um tic-tac “parcial”…
— Sim, porque a única função de um presidente do Supremo é fixar a pauta das votações. E ele marcou a hora com a precisão de um Big Ben … de Propriá ! Tudo de forma a pegar o jornal nacional do dia … Aqueles inesquecíveis 18′ do jornal nacional … ( Clique aqui para ler  e aqui também)
— Poxa, veja como o Ataulfo pensa na frente dos acontecimentos …
— Como assim, Imperador …
— Ele e o Ayres Britto jogam na criação do fato consumado.
— Qual … consumado ? Essa palavra “fato” não deve ser pronunciada no contexto do Supremo …
— O Ataulfo e o Britto tentam impedir que o Dirceu e o Genoino tenham direito a recursos, ou seja, direito a uma “segunda” instância dentro do Supremo.
— Mas, Imperador, o Ataulfo não tem o poder de mudar o regimento do Supremo e o regimento estabelece que tem que julgar os recursos com um novo relator e um novo plenário. Ou eu li o regimento errado. Li o do Supremo de Constantinopla …
— Meu filho, o Supremo é capaz de pegar a Constituição e o Regimento Interno e …
— Já sei, Imperador. Pegam a Constituição e o regimento interno e … Sugiro que o Senhor vá em busca da doce Teodora.
Pano rápido.

Paulo Henrique Amorim

(*) Até agora, Ataulfo de Paiva era o mais medíocre dos imortais da história da Academia Brasileira de Letras. Tão mediocre, que, ao assumir, o sucessor, José Lins do Rego, rompeu a tradição e, em lugar de exaltar as virtudes do morto, espinafrou sua notoria mediocridade.
(**)  Clique aqui para ver como eminente colonista do Globo se referiu a Ele . E aqui para ver como outra eminente colonista da GloboNews e da CBN se refere a Ele. E não é que o Noblat insiste  em chamar Gilmar Mendes de Gilmar Dantas ? Aí, já não é ato falho: é perseguição, mesmo. Isso dá processo…

Emanuel Cancella: Aves de rapina sobrevoam a Petrobras « Viomundo – O que você não vê na mídia

Emanuel Cancella: Aves de rapina sobrevoam a Petrobras « Viomundo – O que você não vê na mídia

Aves de rapina sobrevoam a Petrobras

publicado em 8 de fevereiro de 2013 às 18:35

Prejuízo da Petrobrás: a grande mentira
Por Emanuel Cancella*
A Petrobrás é uma empresa estatal. Uma das diferenças entre uma empresa privada e uma estatal é o seu compromisso não apenas com o lucro mas com um projeto de desenvolvimento nacional. Por isso é preciso desconfiar quando se alardeia que “a Petrobrás teve prejuízo em 2012”, o que é uma grande mentira. Como nada acontece por acaso, não demorou a serem plantadas justificativas para a privatização, como “saída inevitável para a crise”. O fato é que as aves de rapina não descansam. Estão sempre prontas a dar o bote.
Vamos colocar os pingos nos is: a Petrobrás lucrou em 2012 RS 21,1 bilhões. Isso depois de produzir, refinar, comercializar, transportar e garantir o abastecimento de derivados de petróleo em todo o país. Aliás, essa é a sua função constitucional.
A título de comparação, entre as empresas brasileiras, a Petrobrás continuou na liderança. Depois dela veio o Banco Itaú que lucrou R$ 13,59 bi. Mas os bancos se utilizam de várias brechas legais para burlar o pagamento de impostos e não têm compromisso social, não investem no desenvolvimento nacional (ao contrário do que fazem as empresas estatais).
Por exemplo: a Petrobrás paga royalties à União, aos estados e municípios. A companhia também financia 50% do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC. É, ainda, a empresa que mais paga impostos para União, estados e municípios. Sem contar os inúmeros projetos culturais.
Alguma outra empresa ficaria oito anos com o preço da gasolina congelado, para impedir que a inflação e os preços disparassem? E isso pode ser considerado ruim para o povo brasileiro? É bom refletir sobre o papel social da empresa, antes de aplaudir aqueles de raciocínio estreito que só calculam o lucro imediato. Historicamente, quem sempre financiou o desenvolvimento do nosso país foi o capital estatal.
Mas por que a Petrobrás lucrou menos em 2012?
A crítica à Petrobrás é por conta da queda de seu lucro em 32%. Um dos principais motivos da queda nos lucros da Petrobrás foi a importação de gasolina durante certo período, em consequência da necessidade de suprir o mercado interno. Para estimular a indústria de automóveis, o governo isentou os compradores do pagamento do IPI. Resultado: aumentou significativamente a frota de automóvel nas ruas, sem esperar que a empresa se preparasse para a nova demanda.
Para atender o crescimento do consumo, a Petrobrás precisou importar parte da gasolina, pagando mais caro, e revendeu no mercado interno subsidiando parte do seu custo. Mas, a pergunta que não quer calar: por que a Petrobrás também teve que subsidiar a gasolina repassada aos postos de bandeira estrangeira (Shell, Esso, Texaco, Repsol etc)? Por que os postos de bandeira estrangeira não dividiram o prejuízo no custo final da gasolina com a Petrobrás? Com a palavra, a responsável pela fiscalização, Agência Nacional de Petróleo e Gás Combustível – ANP.
Mas a Petrobrás – repetimos – ainda é uma empresa estatal e, por isso, pensa no futuro e não apenas no lucro imediato. A preocupação com o futuro levou à construção de mais cinco refinarias o que, além de suprir o mercado interno, vai permitir a exportação de derivados de petróleo.
Então, por que privatizar?
A sociedade tem que ficar atenta já que a presidente da companhia, Maria das Graças Foster, encabeça uma campanha junto à grande mídia para desgastar a companhia e possibilitar a privatização da Petrobrás, seja por inteiro ou, como já se cogita nos bastidores: a criação de uma empresa de refino e a venda de 30% das ações dessa empresa.
Foster também já vendeu blocos de petróleo, o BS-4, na Bacia de Santos, para o mega empresário Eike Batista, através do plano de desinvestimento. Ou seja, Foster está entregando nossos poços de petróleo, que são patrimônio de todo o povo brasileiro. Será que teremos uma nova “privataria” pela frente?

domingo, 3 de fevereiro de 2013

A imbecilização do Brasil | Carta Capital

A imbecilização do Brasil | Carta Capital

Mino Carta

Editorial

01.02.2013 08:33

A imbecilização do Brasil


Há muito tempo o Brasil não produz escritores como Guimarães Rosa ou Gilberto Freyre. Há muito tempo o Brasil não produz pintores como Candido Portinari. Há muito tempo o Brasil não produz historiadores como Raymundo Faoro. Há muito tempo o Brasil não produz polivalentes cultores da ironia como Nelson Rodrigues. Há muito tempo o Brasil não produz jornalistas como Claudio Abramo, e mesmo repórteres como Rubem Braga e Joel Silveira. Há muito tempo…
Os derradeiros, notáveis intérpretes da cultura brasileira já passaram dos 60 anos, quando não dos 70, como Alfredo Bosi ou Ariano Suassuna ou Paulo Mendes da Rocha. Sobra no mais um deserto de oásis raros e até inesperados. Como o filme O Som ao Redor, de Kleber Mendonça, que acaba de ser lançado, para os nossos encantos e surpresa.
Nos últimos dez anos o País experimentou inegáveis progressos econômicos e sociais, e a história ensina que estes, quando ocorrem, costumam coincidir com avanços culturais. Vale sublinhar, está claro, que o novo consumidor não adquire automaticamente a consciência da cidadania. Houve, de resto, e por exemplo, progressos em termos de educação, de ensino público? Muito pelo contrário.



E houve, decerto, algo pior, o esforço concentrado dos senhores da casa-grande no sentido de manter a maioria no limbo, caso não fosse possível segurá-la debaixo do tacão. Neste nosso limbo terrestre a ignorância é comum a todos, mas, obviamente, o poder pertence a poucos, certos de que lhes cabe por direito divino. Indispensável à tarefa, a contribuição do mais afiado instrumento à disposição, a mídia nativa. Não é que não tenha servido ao poder desde sempre. No entanto, nas últimas décadas cumpriu seu papel destrutivo com truculência nunca dantes navegada.
Falemos, contudo, de amenidades do vídeo. De saída, para encaminhar a conversa. Falemos do Big Brother Brasil, das lutas do MMA e do UFC, dos programas de auditório, de toda uma produção destinada a educar o povo brasileiro, sem falar das telenovelas, de hábito empenhadas em mostrar uma sociedade inexistente, integrada por seres sem sombra. Deste ponto de vista, a Globo tem sido de uma eficácia insuperável.
O espetáculo de vulgaridade e ignorância oferecido no vídeo não tem similares mundo afora, enquanto eu me colho a recordar os programas de rádio que ouvia, adolescente, graciosas, adoráveis peças de museu como a PRK30, ou anos verdolengos habitados pelos magistrais shows de Chico Anysio. Cito exemplos, mas há outros. Creio que a Globo ocupe a vanguarda desta operação de imbecilização coletiva, de espectro infindo, na sua capacidade de incluir a todos, do primeiro ao último andar da escada social.
O trabalho da imprensa é mais sutil, pontiagudo como o buril do ourives. Visa à minoria, além dos donos do poder -real, que, além do mais, ditam o pensamento único, fixam-lhe os limites e determinam suas formas de expressão. O alvo é a chamada classe média alta, os aspirantes, a segunda turma da classe A, o creme que não chegou ao creme do creme. E classe B também. Leitores, em primeiro lugar, dos editoriais e colunas destacadas dos jornalões, e da Veja, a inefável semanal da Editora Abril. Alguns remediados entram na dança, precipitados na exibição, de verdade inadequada para eles.
Aqui está a bucha do canhão midiático. Em geral, fiéis da casa-grande encarada como meta de chegada radiosa, mesmo quando ancorada, em termos paulistanos, às margens do Rio Pinheiros, o formidável esgoto ao ar livre. E, em geral, inabilitados ao exercício do espírito crítico. Quem ainda o pratica, passa de espanto a espanto, e o maior, se admissível a classificação, é que os próprios editorialistas, colunistas, articulistas etc. etc. acabem por acreditar nos enredos ficcionais tecidos por eles próprios, quando não nas mentiras assacadas com heroica impavidez.
O deserto cultural em que vivemos tem largas e evidentes explicações, entre elas, a lassidão de quem teria condições de resistir. Agrada-me, de todo modo, o relativo otimismo de Alfredo Bosi, que enriquece esta edição. Mesmo em épocas medíocres pode medrar o gênio, diz ele, ainda que isto me lembre a Península Ibérica, terra de grandes personagens solitárias em lugar de escolas do saber. Um músico e poeta italiano do século passado, Fabrizio de André, cantou: “Nada nasce dos diamantes, do estrume nascem as flores”. E do deserto?

“CIA tem acesso ao material do Google”, revela Assange – Blog do Esmael

“CIA tem acesso ao material do Google”, revela Assange – Blog do Esmael
A Internet está se transformando no maior instrumento de vigilância já criado e a liberdade que ela representa estaria seriamente ameaçada. A avaliação é de Julian Assange, criador do Wikileaks e que, há sete meses, vive na embaixada do Equador em Londres. Para ele, a web redefiniu as relações de poder no mundo, se transformou no “sistema nervoso central hoje das sociedades” e chega a ser mais determinante que armas. O problema é que esse poder está agora se virando contra as populações.
O australiano recebeu a reportagem do Estado para uma entrevista sobre seu livro “Cypherpunks, Liberdade e o Futuro da Internet”, que está sendo lançado no Brasil nesta semana pela Boitempo Editorial.
Segundo ele, ao colocar informações em redes sociais, internautas pelo mundo estão fazendo um trabalho de graça para a CIA. “Hoje, o Google sabe mais sobre você que sua mãe”, disse. “Esse é o maior roubo da história”.
Durante a entrevista, Assange defendeu seu anfitrião, o presidente equatoriano Rafael Correa, diante de sua ação contra jornais no Equador.
Sobre o futuro do Wikileaks, Assange já prometeu que, em 2013, um milhão de novos documentos serão publicados. Ao Estado, ele garantiu: “haverá muita coisa sobre o Brasil”. Confira abaixo alguns trechos:
O Estado de S. Paulo: A Internet é o símbolo da emancipação para muitos e foi apresentada como a maior revolução já feita. Mas agora o sr. traz a ideia de que há uma contra-ofensiva a isso tudo. O sr. considera que a Internet está em uma encruzilhada?
Julian Assange: Diferentes tecnologias produzem mais poder para estruturas existentes ou indivíduos e isso tem sido a história do desenvolvimento tecnológico, ao ponto que podemos ver a história da civilização humana como a história do desenvolvimento de diferentes armas de diferentes tipos. Por exemplo, quando rifles, que podiam ser obtidos por pequenos grupos, eram as armas dominantes em seu dia, ou navios de guerra ou bombas atômicas. E isso define a relação de poder entre diferentes grupos de pessoas pelo mundo. Desde 1945, a relação entre as superpotências dominantes tem sido definida por quem tem acesso às armas atômicas. Mas o que ocorre agora é que Internet é tão significativa que está começando a redefinir as relações de força que antes eram definidas pelos diferentes sistemas de armas que um país tinha. Isso porque todas as sociedades que tem qualquer desenvolvimento tecnológico, que são as sociedades influentes, se fundiram totalmente com a Internet. Portanto, não há uma separação entre o que nós pensamos normalmente que é uma sociedade, indivíduos, burocracia, estados e internet.
A internet é o alicerce da sociedade, suas artérias, os nervos e está conectando os estados por cima das fronteiras. A Internet é um centro, se não for o centro, da nossa sociedade. Ela está envolvida na forma que uma sociedade se comunica consigo mesmo, como se comunica entre elas. Não é só simplesmente um sistema de armas ou fonte energia. Não é certo pensar como se fosse o sangue da sociedade. É o sistema nervoso central da socidade. Portanto, se há um problema na Internet, há um problema com o sistema nervoso da sociedade. Agora, víamos antes a internet como uma força liberatadora, que garantia às pessoas que não tinham informação com informação e, mais importante ainda, com conhecimento. Conhecimento é poder. Outras coisas tambem são poder. Mas ela deu muito poder a pessoas que antes não tinham poder. E não apenas mudou a relação entre os que tem poder e aquelas que não tem, dando conhecimento àqueles que não tinham conhecimento. Mas também fez todo o sistema funcionar de forma mais inteligente. Todos passaram a poder tomar decisões mais inteligentes e puderam passar a cooperar de forma mais inteligente. Agindo contrário a essa força está a vigilância em massa criada por parte do estado.
O Estado de S. Paulo: De que forma estaria ocorrendo essa vigilância em massa?
JA: As sociedades se fundiram com a internet, diante do fato de que comunicações entre os indivíduos ocorrem pela Internet, os sistemas de telefone estão na Internet, bancos e transações usam a Internet. Estamos colocando nossos pensamentos mais íntimos na Internet, detalhes de comunicações e mesmo entre marido e muher, nossa posição geográfica. Enfim, tudo está sendo exposto na Internet. Isso signifca que grupos que estão envolvidos em vigilância em massa tem conseguido realizar uma transferencia em massa de conhecimento em sua direção. Os grupos que já tinham muito conhecimento agora tem mais. Esse é o maior roubo que de fato já ocorreu na história. Essa transferência de conhecido, de todas as comunicações interceptadas para agências nacionais de segurança e seus amigos corporativos. A tecnologia está sendo desenvolvida para essa vigilância em massa está sendo vendida por empresas de países, como a França, que vendeu um sistema de vigilância para o regime de Kadafi. Na África do Sul, há um sistema desenhado para gravar de forma permanente todas as ligações que entram e saem do país e as estocam por apenas US$ 10 milhões por ano. Está ficando muito barato. A população mundial dobra a cada 20 anos. O custo de vigilância está caindo pela metade a cada 18 meses.
O Estado de S. Paulo: Mas, justamente o sr. citou Kadafi. Muito acreditam que a Primavera Árabe só ocorreu graças à Internet. Não teria sido esse o caso?
JA: Há uma série de histórias tradicionais de um longo trabalho de ativistas, de sindicatos e até de clubes de futebol que tiveram um papel importante na Tunísia e no Egito, os Ultras. O que é realmente novo? Bom, algumas coisas: o ativismo pan-arábico é algo novo e potenciado pela web. Diferentes ativistas em diferentes países se conectaram entre si pela web, trocando dicas, identificando quem era bem e quem era mau. O movimento dos Ultras vieram da Itália para os clubes da Tunísia e Egito. Como? Pela Internet. E então há o Wikileaks, jogando muita informação e essa informação então foi atacada pelo regime na Tunísia e depois pelo Egito. Mas também sendo disseminada pelo Egito e Tunisia. Mais importante ainda, essa informação foi disseminada para fora desses países, a tal ponto que ficou difícil para os Estados Unidos e Europa defenderem seus tradicionais aliados.
O Estado de S. Paulo: O sr. aponta para o poder de redes como Facebook e Google. Confesso que não tenho certeza que Mark Zuckerberg (criador do Facebook) pensou nisso tudo quando estava criando o site. Como é que se tornaram tão poderosos e como é que são, como o sr. diz, usados contra civis?
JA: Google, essencialmente, sabe o que você estava pensando. E sabe também (o que vc pensou) no passado. Porque quando você tem algum pensando sobre algo, quer saber algum detalhe, você busca no Google. Sites que tem Google Adds, que na verdade são todos os sites, registram sua visita. Portanto, Google sabe todos os sites que você visitou, tudo o que você buscou, se você usou gmail ou email. Então ele te conhece melhor que você mesmo. Um exemplo: você sabe o que você buscou há dois dias, há três meses? Não. Mas o Google sabe. Google conhece você melhor que sua mãe. Claro, mas alguém pode dizer: Google só quer vender publicidade. Portanto, quem se importa que eles estejam fazendo isso. Mas, na realidade, todas as agências de inteligência americana e de aplicação da lei tem acesso ao material do Google. Eles acessaram isso em nosso caso.
O Estado de S. Paulo: Como fizeram isso?
JA: Eles usaram instrumentos como cartas da agência de segurança nacional e mandados para buscar os dados de email das pessoas envolvidas em nossa organização. Isso saiu do Google, da conta do Twitter, onde pessoas entraram para acompanhar a nossa conta. No caso do Facebook, é algo impressionante. As pessoas simplesmente estão fazendo bilhões de centenas de horas de trabalho gratuíto para a CIA. Colocando na rede todos seus amigos, suas relações com eles, seus parentes, relatando o que estão fazendo, dizendo que vi aquela pessoa naquela festa, aquela pessoa naquela loja. É um incrível instrumento de controle. Países como a Islândia tem uma penetração do Facebbok de 88%. Mesmo que você não esteja no Facebook, você pode ter certeza que teu irmão está e está relatando sobre você, ou sua namorada está relatando sobre você. Não há como escapar. Agora, quando uma organização como Facebook diz que as pessoas querem fazer isso…
O Estado de S. Paulo: Claro, essa é justamente a minha questão: como o sr. explica que pessoas de diferentes culturas e religiões estão dispostas a revelar suas vidas diante da web?
JA: Claro, sobre o que é que você está paranoico. Você pode dizer: bom, estou fazendo isso de forma voluntária e é mais importante estabelecer conexões sociais que se preocupar com um aparato de um estado totalitário. O problema é que isso não é verdade. As pessoas dizem que querem compartilhar algo apenas com meus amigos e amigos de meus amigos, mas não com meus amigos e com a CIA. É uma decepção o que está ocorrendo. As pessoas estão sendo enganadas em desenvolver essa atividade.

No papel, Brasil é dois Estados de SP maior do que o oficial - politica - politica - Estadão

No papel, Brasil é dois Estados de SP maior do que o oficial - politica - politica - Estadão
SÃO PAULO - Do Oiapoque ao Chuí, o território brasileiro tem cerca de 8,5 milhões de km². Oficialmente, segundo o IBGE, essa é a superfície do País. No papel, porém, o território brasileiro é maior. Quando se faz a soma da área de todos os imóveis rurais cadastrados no Instituto Nacional de Colonização e Reforma (Incra), o resultado final chega a 9,1 milhões de km².


É uma diferença notável: a área que sobra equivale a duas vezes o território do Estado de São Paulo. Ou, para quem se sente melhor com grandezas imperialistas, à soma dos territórios da Alemanha e Inglaterra.
O esticamento do território nacional foi verificado pelo Sindicato Nacional dos Peritos Federais Agrários, após obter no Incra, por meio da Lei de Acesso à Informação, dados detalhados do Serviço Nacional de Cadastro Rural - que tem a tarefa de recolher informações de todos os imóveis rurais registrados no País. O mapeamento reúne informações de 2011. As de 2012 ainda não foram compiladas pelo Incra.
Os peritos concluíram que o Brasil, uma das maiores potências agrícolas do mundo, está longe de ter um cadastro de terras confiável. O problema mais aparente é o que eles chamam de sobrecadastro - quando a soma das áreas declaradas pelos proprietários nos cartórios supera a superfície real do município. Nessa categoria, o caso que mais chama a atenção é o de Ladário, no Mato Grosso do Sul.
Dez andares. De acordo com o IBGE, a superfície daquele município alcança 34.250 hectares. Mas a soma da área dos 139 imóveis cadastrados é mais do que dez vezes maior: chega a 397.999 hectares. Dito de outra forma, para que o território cadastrado coubesse no real seria necessário erguer dez andares de terras sobre Ladário.
O município sul-mato-grossense chama a atenção por estar no topo da lista, mas o problema não ocorre só lá, nem é exclusividade do Brasil profundo. Palmas e Cuiabá, capitais de dois Estados que se destacam como importantes produtores agrícolas - Tocantins e Mato Grosso -, enfrentam o mesmo problema.
Pelas informações obtidas no Incra, dos 5.565 municípios brasileiros, 1.354 tem sobrecadastramento, o que representa cerca de um em cada quatro. A razão mais comum para o descompasso são fraudes nos registros e até erros na transcrição dos números. Mas não é só. Os peritos apontam desatualização dos registros e, sobretudo, as condições precárias em que são feitos.
“Quase tudo gira em torno da declaração que o proprietário faz no cartório sobre o tamanho de sua terra”, diz Fernando Faccio, perito federal do Incra em Florianópolis (SC) e porta-voz do sindicato. “Os órgãos estaduais de terras não possuem um bom mapeamento das áreas; os cartórios não têm obrigação de garantir que a terra registrada não está em cima de outra; e o Poder Público também não vai lá verificar.”
Para Faccio, o fato de o Brasil não conhecer sua malha fundiária é inaceitável, principalmente quando se considera que as tecnologias já existentes, como o georreferenciamento, permitem resolver o problema de maneira eficiente. “Só posso imaginar que os empecilhos no caminho da modernidade são essencialmente políticos.”
Terra a menos. Sobra de terra no cadastro não é o único drama. Na região Norte do País verifica-se o subcadastramento, que ocorre quando a superfície registrada é menor do que a real. A causa principal é a existência de grandes áreas de terras devolutas, controladas pelo Estado e frequentemente ocupadas de maneira irregular.
O sindicato estima que na região amazônica só 4% do território está cadastrado. “Os órgãos de governo não tem controle de suas terras, o que acaba favorecendo os conflitos agrários na região”, afirma Faccio.
O sindicato do qual ele faz parte defende a ideia de que o Incra passe a se dedicar exclusivamente ao controle fundiário, transferindo para outros organismos a questão da reforma agrária. O órgão passaria a se chamar Instituto de Terras.
“Sem conhecer sua malha fundiária, o Brasil não consegue definir políticas públicas de maneira consistente, não consegue evitar a insegurança jurídica. No momento não se sabe nem quanta terra se encontra nas mãos de estrangeiros”, observa o perito.
O assunto atrai a atenção da presidente Dilma Rousseff desde quando era chefe da Casa Civil. Confrontada com questões relacionadas a desmatamento, conflitos agrários, políticas sociais na zona rural, a então ministra constatou que existem cadastros paralelos no Incra, na Receita Federal e nos ministérios do Meio Ambiente e da Agricultura - e que nenhum deles é confiável.
Na Presidência, ela tem cobrado a consolidação de um cadastro único e confiável. A ministra Gleise Hoffmann, que substituiu Dilma na Casa Civil, é uma das pessoas encarregadas de analisar a questão. 

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Você pensa que é livre. Mas, na verdade, livre é o gato laranja

Você pensa que é livre. Mas, na verdade, livre é o gato laranja

Você pensa que é livre. Mas, na verdade, livre é o gato laranja



Todos os dias, às 17h, um gato alaranjado atravessa o telhado em frente à janela da minha sala no escritório. Tranquilo, devagar, despreocupado. Mas firme – como não poderia deixar de ser com um bichano de estirpe. Não sei qual o seu destino. Entregar-se a sevícias com a amante? Cair na farra com outros bigodes do bairro? Ou perpetrar algum ato ilícito? – até porque é impossível alguém ser tão pontual para um compromisso honesto. Nem as carolas, que corriam atrás do padre na igreja do bairro onde cresci chegavam tão pontualmente para a Ave Maria.
Enfim, o gato exala liberdade, provocando inveja neste que vos escreve. Sentimento agravado pelo fato da minha janela ser ornamentada com grades chumbadas pelo proprietário do imóvel, separando o caminho do gato e o meu. “Humano patético”, deve pensar o sacripanta.

Gato laranja, dia 28 de janeiro
Liberdade é uma bela abstração. Na prática, fazemos nossas escolhas dentro de uma faixa de possibilidades previamente determinada pela sociedade ou pelo grupo hegemônico. Somos livres, mas para optar pelas alternativas “a”, “b”, “c” ou “d”. Boa parte das vezes, se escolhermos “nenhuma das anteriores”, o gongo soa e uma cara de repreensão coletiva nos constrange.
Você acha, por exemplo, que exerce liberdade de escolha ao optar por um canal a cabo só porque há centenas de outros a dispor? Pense bem: quem colocou os canais lá? São todas as opções de assuntos e tipos possíveis? Todos os discursos presentes na sociedade estão representados?
Para falar a verdade, nem sua vida lhe pertence. Se, prontamente, pensou algo do tipo “Ah, claro que não, maldito herege! Ela pertence a Deus”, por favor, tome estes cinco reais e vá comprar balas para o tio lá na esquina, ok? Enquanto isso, converso com a mamãe e o papai. Afinal de contas, mesmo em sofrimento atroz, você não é livre para colocar seu ponto final.
Como a vida nos entrega uma miríade de opções pré-moldadas, vamos nos acostumando a considerar que elas são as únicas possibilidades. Nos acomodamos nessa zona de conforto. Não é o Ocidente que vem repetindo há dois mil anos que bem-aventurados os mansos porque eles herdarão a terra? Para o versículo, adotamos a interpretação de cobaia, ou seja, quem não questiona, será recompensado. Agora ou depois. Se é que existe depois.

Gato laranja, dia 29 de janeiro
Enfim, vale sempre lembrar que inovação dentro do sistema é reforma, não revolução, ao contrário do que alguns revolucionários de shopping acreditam fazer. Defender transformações, dentro de parâmetros pré-estalecidos. Buscar mudar o mundo e ser, ao mesmo tempo, o “empregado do mês”. Educados, enquadrados, embutidos, que não precisaram descobrir o que queriam ser quando crescer. Isso foi escolhido para eles.
É claro que possibilitar a ação livre de seres pensantes e contestadores pode colocar em risco a própria estrutura montada para que tudo funcione do jeito em que está. Pessoas assim, que – com espírito de grupo e coletivamente – discutem, debatem, discordam, mudam e criam opções além daqueles oferecidas, em tese, seriam úteis para uma sociedade. Mas, na realidade, são vistas com desconfiança e chamadas de mal-educadas. Subversivas. O capeta.
No jornalismo, a recompensa de cumprir o que o poder político ou econômico espera de nós pode vir na forma de dinheiro, de poder e da vaidade de ter os dois. Do contrário, não raro, colegas são vítimas de censura, ostracismo e danação – que tende a vir na forma de processos criminais ou civis.
Fico me perguntando como é que alguns fuinhas que se intitulam jornalistas se prestam a um papelzinho vergonhoso de publicar versões de grandes corporações sem checar antes a informação? Por glória, por dinheiro ou por medo, o fato é que – ao adotarem esse comportamento de vassalagem profissional – parecem cumprir o que se espera deles. Que não saiam do prumo.
Não estou falando de um caso específico, mas de um pacote que me incomodou muito esses dias. Será que esse pessoal, depois de um dia cheio de “trabalho”, não tem nenhum pesadelo à noite? Do tipo, ser tragado por cimento, afogado em óleo de automóvel, envenenado em pesticida ou enforcado em linha de transmissão?
Para eles, deve ser revoltante ver um gato laranja caminhando livre para onde quiser e tendo a rotina que escolheu. Uma perda de tempo! Se dependesse do julgamento desse pessoal, o gato teria liberdade de se deslocar para onde quisesse, sim. Mas do lado de cá das grades.

Gato laranja, dia 30 de janeiro